
Fonte: Shutterstock.
Deseja ouvir este material?
Áudio disponível no material digital.
CONVITE AO ESTUDO
Prezado aluno, na unidade anterior, você revisou temas essenciais de direito penal material. Estudamos os princípios e as normas penais, os conceitos de crime e seus substratos, o fato típico, a ilicitude e a culpabilidade e, por último, alguns interessantes tipos penais da parte especial do Código Penal e da legislação penal especial. Todos estes temas são essenciais ao exercício de qualquer profissão ligada ao sistema penal, mas são especialmente importantes ao profissional da criminalística.
A partir desta seção, estudaremos os temas de direito processual penal que também são essenciais ao exercício cotidiano do perito criminal. Isso porque a perícia construirá, por meio do método científico, a prova técnica que instrumentalizará a ação penal, fundamentando condenações de culpados e garantindo a absolvição de inocentes.
Por isso começaremos, na primeira seção, pela introdução ao processo penal, com os conceitos introdutórios e os princípios processuais penais fundamentais.
Na segunda seção, estudaremos a modalidade de prisões processuais, incluindo a prisão em flagrante, preventiva e a temporária.
Na terceira e derradeira seção da unidade, estudaremos o mais importante dos temas de direito processual penal para o profissional da criminalística: a teoria geral da prova.
praticar para aprender
Prezado aluno, quando imaginamos um profissional da criminalística, é inevitável reconhecer a importância do direito processual penal para seu dia a dia. O perito criminal utiliza o método científico para produzir a prova técnica que instrumentalizará o processo penal.
Neste contexto, o conhecimento dos conceitos fundamentais do processo penal e dos princípios que o limitam e norteiam é essencial para o bom desempenho de seu trabalho. Afinal, a prova deve ser construída com a observância dos princípios constitucionais, caso contrário, a eventual ilicitude da prova prejudicará o processo como um todo.
Assim, começaremos estudando o que é o processo, o procedimento, quais são seus princípios constitucionais e seus limites.
Continuaremos as nossas situações-problema imaginando que você se encontra em um contexto típico do desempenho da carreira profissional na seara penal, seja como autoridade policial, advogado ou, principalmente, perito criminal.
Imaginemos que você seja recém-concursado como delegado de polícia e, em seu primeiro plantão, se depare com dois presos por um crime de roubo majorado. O primeiro, João, afirma que não tem advogado e que não precisa de um, nem agora e nem em eventual processo, pois, embora não seja formado em direito, sabe muito bem quais são seus direitos e prerrogativas. Contudo, Artur, seu comparsa, afirmou que não falará nada sem a presença de seu advogado que acaba de chegar na delegacia.
Neste momento, você acessa os seus conhecimentos sobre direito processual penal envolvendo o inquérito policial e os princípios processuais penais. Assim, responda:
você, como advogado, poderia dar prosseguimento ao interrogatório sem a presença do advogado de João? Se a resposta for positiva, poderia João continuar sem seu advogado em eventual processo penal? Poderia você negar acesso ao advogado de Artur para conduzir o interrogatório mais rapidamente?
Ao trabalho!
conceito-chave
Prezado aluno, o direito processual penal é o ramo jurídico que estuda as normas instrumentais para aplicação da lei penal. Isto é, trata-se do estudo sistêmico de princípios e regras que regulam a aplicação jurisdicional do direito penal, mas também as atividades investigativas da polícia judiciária e sua estruturação. Porém, não se engane. Não se trata de uma mera ciência acessória ou auxiliar. Nas palavras de Aury Lopes Jr. (2018, p. 33), “o processo penal é um caminho necessário para alcançar-se a pena e, principalmente, um caminho que condiciona o exercício do poder de penar (essência do poder punitivo) à estrita observância de uma série de regras que compõe o devido processo legal”. Em outras palavras, a Constituição Federal condiciona a legitimidade da punição ao exercício da jurisdição: uma vez que ninguém pode ser considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença condenatória (conforme art. 5º LVII da CF) e que a sentença depende da correta observância das fases do processo, não poderá haver aplicação do direito penal sem os institutos processuais. Em palavras mais simples, o direito penal não tem qualquer realidade concreta fora do processo penal.
Estabelecida a importância desta matéria, vamos expor seu objeto, escopo e limites, bem como os direitos fundamentais que a fundamentam. O direito processual penal estuda as normas ligadas aos processos e procedimentos que instrumentalizam a jurisdição penal, o que inclui a ação penal, os procedimentos comuns e especiais, a competência, os recursos e as medidas cautelares como as prisões processuais. Porém, a persecução começa antes do processo, de forma que este ramo do direito estuda também o inquérito policial e as atividades investigativas da polícia judiciária.
A doutrina jurídica atribui ao processo penal pelo menos três características: a autonomia, uma vez que tem regras e princípios próprios e não é hierarquicamente inferior ao processo penal, a instrumentalidade, pois é um instrumento para aplicação da lei penal e normatividade, já que se trata de ciência normativa que atende a uma codificação específica: o Código de Processo Penal (CPP).
Quanto à função ou finalidade, a doutrina costuma elencar uma finalidade imediata e outra mediata para a disciplina (ALVES, 2016). A finalidade imediata ou direta do processo, além de instrumentalizar o direito penal, permitindo a aplicação de pena a quem praticou o crime, consiste na preservação de direitos fundamentais do cidadão contra a arbitrariedade estatal. Assim, o processo justo é condição necessária para o exercício da jurisdição penal e o direito processual convive com a difícil tarefa de equilibrar a eficácia da lei penal com o respeito aos direitos e garantias do acusado. No que tange à finalidade mediata ou indireta, este ramo jurídico tem a mesma função do direito material penal: proteger os bens jurídicos resguardados pelas normas incriminadoras.
Assimile
O processo penal é o ramo do direito que estuda os procedimentos pelos quais o Estado instrumentaliza seu poder-dever de punir. Suas características são a autonomia, instrumentalidade e normatividade. Sua função imediata é resguardar direitos enquanto possibilita a aplicação da lei penal. Sua finalidade mediata é proteger bens jurídicos.
Como o processo penal tem a finalidade de preservar direitos enquanto garante a eficiência na aplicação da lei penal, vejamos agora os princípios que orientam o direito processual penal.
Primeiramente, cabe lembrar que os princípios são mandamentos nucleares do sistema jurídico. São normas estruturantes do próprio sistema jurídico e estabelecem os limites e os objetivos do sistema jurídico. Servem de base para a integração, interpretação e aplicação do direito positivo (NUCCI, 2018). Vejamos, então, os mais importantes princípios constitucionais do processo penal.
Comecemos com o princípio da ampla defesa, previsto explicitamente pelo artigo 5º, LV, da Constituição Federal: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
O princípio da ampla defesa garante que o réu possa se utilizar de todos os meios legais para se defender da imputação feita pela acusação. Este postulado constitucional reconhece a hipossuficiência do réu perante os amplos recursos e estruturas dos órgãos encarregados da persecução penal e, por isso, o acusado tem vários direitos exclusivos oriundos deste princípio: a garantia de autodefesa acompanhada da defesa técnica, a possibilidade de ajuizamento de revisão criminal (o que só pode acontecer em favor do réu), bem como a verificação da eficiência da defesa pelo magistrado que poderá desconstituir o advogado escolhido pelo réu caso perceba que este está indefeso. A doutrina costuma elencar dois desdobramentos deste princípio. O primeiro é o direito à autodefesa, que é aquela promovida diretamente pelo réu, normalmente em seu interrogatório. A Constituição, em seu artigo 5º, LXIII, garante o direito ao silêncio e, consequentemente, a possibilidade de que o réu minta em seu favor. Prevalece que esta última prerrogativa, no entanto, não permite que o réu acuse um inocente ou falseie a própria identidade, isso porque a parte da doutrina, a exemplo de Leonardo Barreto Alves (2016), defende que o réu não pode se calar perante o juiz na primeira fase do interrogatório judicial (art. 187, § 1º do CPP) que se refere às perguntas sobre sua qualificação pessoal.
Assimile
STJ, SÚMULA 522: a conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa.
É preciso ainda diferenciar o direito à autodefesa do direito de audiência, pois este diz respeito à prerrogativa que o réu tem de ser ouvido no processo perante o juiz, o que também não se confunde com o direito de presença, que se refere à prerrogativa do réu de estar presente nos atos processuais da ação penal em que é julgado. Quanto a este último direito, discute-se se a ausência do réu gera nulidade quando seu defensor estava presente no ato, principalmente quando não existir prejuízo no que tange ao resultado do processo.
O segundo desdobramento da ampla defesa consiste no direito à defesa técnica, que é aquela promovida por um defensor técnico, bacharel em direito, previamente aprovado em exame de aptidão (advogado ou defensor público) e indisponível no processo. Havendo ausência de defensor constituído, o juiz deverá intimar o acusado para nomear outro advogado e, caso o réu permaneça inerte, deverá o juiz nomear um defensor dativo (Art. 263 do CPP). A defesa técnica redigirá todas as peças processuais imprescindíveis para o desenrolar da ação penal, o que incluirá a resposta à acusação, as alegações finais eventualmente realizadas sobre a forma de memoriais e eventuais recursos e petições.
O princípio do contraditório, por sua vez, também é extraído do artigo 5º, LV da CF, e, segundo a doutrina mais aceita (DEZEM, 2020), apregoa que ambas as partes têm o direito de se manifestar sobre qualquer prova produzida ou fato alegado pela parte contrária. O princípio garante a ambas as partes o direito de ser intimado sobre fatos e provas, de se manifestar sobre fatos e provas e, acima de tudo, de efetivamente influenciar na decisão do juiz, ou seja, o contraditório não pode ser uma mera formalidade de troca de petições, devendo cada parte ter oportunidade genuína de manifestação de suas razões, teses e argumentos.
Cumpre ressaltar que o contraditório não tem incidência absoluta, apresentando pelo menos duas limitações segundo a doutrina. A primeira diz respeito ao inquérito policial que estudaremos ainda nesta seção. A segunda é referente às medidas que, por sua natureza, são incompatíveis com um contraditório prévio, como a interceptação telefônica. Contudo, o contraditório nestas últimas será apenas diferido, ou seja, adiado para um momento posterior quando a defesa terá acesso a tudo o que foi produzido e poderá arguir o que entender de direito (DEZEM, 2020).
No processo penal, existem pelo menos duas importantes súmulas do Supremo Tribunal Federal com relação ao contraditório.
STF, súmula 523: No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.
STF, súmula 701: No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo.
O princípio da isonomia também é conhecido como o princípio da igualdade ou da paridade de armas, embora parte da doutrina afirme a paridade de armas é uma consequência da isonomia e não seu sinônimo (DEZEM, 2020). Este princípio é desdobramento do próprio artigo 5º da Constituição Federal que garante o direito de igualdade a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país.
No processo penal, o princípio da isonomia garante que os sujeitos processuais não terão desequilíbrios injustificados. Isso não quer dizer que o tratamento de acusação e defesa será absolutamente equivalente, mas que qualquer diferenciação siga critério razoável e lógico, que vise retirar as partes de seu natural estado de desigualdade e equipará-las no mesmo plano, conforme já dito no princípio da ampla defesa, pelo qual o acusado recebe prerrogativas em comparação ao órgão acusador, para que se trate os desiguais desigualmente na medida da sua desigualdade.
Exemplificando
Como exemplos de consequências práticas do princípio da isonomia, a a defesa técnica deve ser feita necessariamente por meio de bacharel em direito devidamente habilitado na OAB ou defensor público concursado, afinal a acusação necessariamente o será (art. 263 do CPP). Ademais, deve haver igual possibilidade de manifestação entre acusação e defesa durante os atos processuais.
Já o princípio do juiz natural é que afirma que ninguém deve ser julgado por um juiz que não seja previamente competente. Este princípio tem tripla previsão em nosso ordenamento jurídico. As duas primeiras estão na própria Constituição Feral, artigo 5º, incisos XXXVII e LIII, que preveem que “não haverá juízo ou tribunal de exceção” (BRASIL, 1988, n.p.) e que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”, respectivamente. Já a terceira se encontra no Pacto de São José da Costa Rica, art. 8º, 1, cuja previsão é a seguinte:
Art. 8º. [...] 1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.
Há pelo menos três garantias que se desdobram a partir do princípio do juiz natural. A primeira é o direito de ser julgado apenas por um juiz competente. A segunda é a de que somente os órgãos instituídos pela Constituição Federal possam exercer legitimamente a jurisdição. A terceira é a de que não podem existir tribunais de exceção, isto é, não se pode criar um juízo para julgar fato passado (DEZEM, 2020). Afinal, todo tribunal de exceção tem o viés da força política que o criou.
Reflita
O tribunal de exceção mais significativo do século XX é, com certeza, o tribunal de Nuremberg que julgou os militares e políticos da Alemanha depois da segunda guerra mundial. Reflita: em que pese os horrores praticados pelos nazistas na Europa, é legítimo que os Estados vencedores na guerra organizem um tribunal de exceção para julgar os vencidos?
Para satisfazer este princípio, a Constituição Federal estabelece a estrutura básica da competência jurisdicional da Justiça Federal e dos Estados. O Código de Processo Penal complementa, estabelecendo a competência em razão do local e da matéria.
Estudemos agora, um dos mais importantes princípios do processo penal: o princípio da presunção da inocência ou do estado de inocência ou da situação jurídica de inocência ou da presunção de não culpabilidade encontra-se no art. 5º, LVII, da CF: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (BRASIL, 1988, n.p.).
Preferimos a expressão situação jurídica de inocência, do jurista Eugênio Pacelli de Oliveira (2015), uma vez que a inocência não depende de previsão legal, ela existe até que seja desmentida por sentença penal transitada em julgado.
Há três importantes consequências do princípio do estado de inocência. Primeiramente, o ônus da prova cabe, em regra, à acusação, uma vez que o art. 156 do CPP estabelece que a prova incumbirá a quem fizer a alegação. Assim, deve a parte acusadora provar a materialidade e a autoria (fato típico) do crime objeto da imputação. A defesa, contudo, ainda deve provar a causa de exclusão de ilicitude e culpabilidade que eventualmente alegar.
A segunda consequência está na excepcionalidade das prisões cautelares. A razão é simples: se o réu é inocente até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, sua prisão, antes deste marco, só pode se justificar por graves razões de cautela. Assim, as duas prisões cautelares do sistema penal brasileiro têm rígidos requisitos que devem ser demonstrados pela parte ou autoridade que requer ou representa a prisão; são elas: a prisão preventiva e a prisão temporária. A preventiva tem pressupostos estabelecidos no artigo 312 do Código de Processo Penal (CPP).
Art. 311. Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.
Já os requisitos da prisão temporária se encontram na Lei nº 7.960/89, em seu artigo 1º. Estudaremos estes requisitos e todas as hipóteses das prisões processuais nas seções seguintes.
Por fim, a terceira garantia oriunda do princípio da situação jurídica de inocência é a de que toda medida restritiva de direitos individuais deve ser decretada excepcionalmente. Isso inclui as medidas previstas no artigo 319 do CPP, que são alternativas à prisão preventiva, bem como as medidas investigativas como a quebra de sigilo fiscal, bancário e telefônico, a busca e apreensão domiciliar, dentre outras. Neste sentido, o artigo 282 do CPP estabelece a necessidade de se observar, como fundamento das medidas cautelares pessoais no processo penal, a necessidade de razões de cautela.
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:
I – necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.
Dediquemos um pouco de atenção para a persecução penal em si, que, normalmente, se inicia com a investigação do delito.
O inquérito policial é um procedimento administrativo preparatório para a ação penal, conduzido por uma autoridade de polícia judiciária, que tem como objetivo a colheita preliminar de provas da materialidade e de autoria da infração penal para formação da convicção da parte acusadora, além da colheita de provas urgentes que podem desaparecer.
O inquérito não um procedimento processual, ou seja, não se reveste das mesmas garantias e características do processo penal propriamente dito. Resumindo as características do inquérito, percebemos que se trata de um procedimento inquisitivo, uma vez que não há contraditório e ampla defesa durante o inquérito, mas apenas na fase processual. É bem verdade que a Lei nº 13.245/16 mitigou um pouco esta característica ao acrescentar o inciso XXI ao art. 7º do Estatuto da OAB, que passou a permitir que o advogado apresente razões e quesitos no inquérito, porém, a doutrina ainda aponta a inquisitividade como ínsita a este procedimento, pois a presença do advogado, embora não possa ser negada pelo delegado, sob pena de viciar os atos como o interrogatório, não é estritamente necessária no inquérito.
A inexistência de nulidades é a segunda característica, pois tratando-se de um procedimento meramente informativo, seus eventuais vícios não maculam o processo, devendo acarretar apenas na ineficácia do ato em si. O inquérito é um procedimento escrito, conforme estabelecido no próprio artigo 9º do CPP, os atos orais são reduzidos a termo. O sigilo é a quinta característica, pois suas peças informativas não são abertas ao público, uma vez que é necessário preservar a reputação do investigado de eventuais sensacionalismos. Contudo, o sigilo não é absoluto e, por isso, não é aplicável ao juiz, ao Ministério Público e ao advogado do investigado. No entanto, podem existir algumas diligências que, por sua própria natureza, não teriam eficácia caso o defensor a elas tivesse acesso desde que fossem deflagradas. A interceptação telefônica é um óbvio exemplo. Porém, uma vez documentada nos autos do inquérito, a diligência deverá ser integralmente revelada ao advogado, conforme apregoa o próprio Estatuto da OAB, Lei nº 8.906/94, no art. 7º, XIV e § 11, bem como na súmula vinculante 14 do STF.
Art. 7º São direitos do advogado:
XIV – examinar, em qualquer instituição responsável por conduzir investigação, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de investigações de qualquer natureza, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos, em meio físico ou digital;
§ 11. No caso previsto no inciso XIV, a autoridade competente poderá delimitar o acesso do advogado aos elementos de prova relacionados a diligências em andamento e ainda não documentados nos autos, quando houver risco de comprometimento da eficiência, da eficácia ou da finalidade das diligências.
STF, Súmula vinculante 14: É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.
Também são características do inquérito policial a oficialidade, uma vez que é procedimento presidido pela polícia judiciária que é órgão oficial do Estado, a autoritariedade, já que o delegado de polícia que o preside é autoridade pública, a indisponibilidade, pois, conforme artigo 17 do CPP, uma vez instaurado, não pode a autoridade policial simplesmente determinar o arquivamento do inquérito. Este somente poderá ser arquivado mediante requerimento do Ministério Público e homologação do juiz. Finalmente, a oficiosidade é a característica perceptível nos crimes de ação penal pública, pois, nestas, a autoridade policial tem o dever de instaurar o inquérito de ofício.
Assimile
São características do inquérito policial: inquisitividade, inexistência de nulidades, escrito, sigilosidade, oficialidade, autoritariedade, oficiosidade e indisponibilidade.
O inquérito policial pode ser iniciado de ofício pela autoridade policial, por requerimento do ofendido, por delação de terceiro, por requisição da autoridade competente (MP ou juiz de direito, por exemplo) conforme consta no artigo 5º do CPP. É sempre bom lembrar que, nos crimes de ação penal pública condicionada à representação, sem esta o inquérito não pode se iniciar (art. 5º, § 4º) e nos crimes de ação penal privada, apenas quem tem qualidade para iniciar a ação poderá autorizar o inquérito (art. 5º, § 5º).
Durante o procedimento, o delegado e seus agentes farão diversas diligências em prol de desvendar a materialidade e autoria da infração. Elas estão descritas nos artigos 6º e 7º do CPP, que merecem ser lidos integralmente.
O prazo para finalizar o inquérito é de 30 dias (prorrogáveis) quando o investigado está solto e 10 dias (improrrogáveis) quando o investigado está preso preventivamente. O inquérito terminará com um relatório no qual delegado poderá concluir ou não pelo indiciamento do investigado (art. 10, §§ 1º e 2º do CPP) a partir do qual o Ministério Público poderá requisitar novas investigações (art. 16 do CPP) ou oferecer a denúncia, iniciando o processo penal propriamente dito.
É sempre bom lembrar que a opinião do delegado não vincula o promotor de justiça e que o próprio inquérito policial é procedimento dispensável para o início da ação penal, pois os pressupostos de admissibilidade desta podem ser angariados de outras formas.
Falemos agora dos sistemas processuais.
Por meio da história dos processos penais ao longo dos últimos milênios, é possível perceber 3 grandes sistemas de persecução penal: o sistema inquisitivo, o acusatório e o misto (NUCCI, 2018).
O sistema inquisitivo originou-se em Roma e é caracterizado, precipuamente, pela concentração de poderes e de funções processuais nas mãos do juiz, que também atua como acusador e defensor. Ademais, em um sistema inquisitivo, a confissão do réu é considerada a “rainha das provas” e, por isso, mais valiosa que qualquer outra, sendo permitido até mesmo a tortura para obtê-la. O procedimento normalmente se dá de forma secreta e não é marcado pelo contraditório ou pela ampla defesa.
O sistema acusatório nasceu na Grécia e tem clara separação entre acusação, defesa e julgador. Os procedimentos apresentam mais oralidade e publicidade, há contraditório e ampla defesa, um sistema de livre convencimento motivado na produção de provas e isonomia entre as partes.
Um sistema misto é aquele que combina elementos de ambos os sistemas ou que tem uma fase processual inquisitiva seguida de uma fase processual acusatória.
Em que pese haver doutrina que afirme que o sistema brasileiro é misto, uma vez que existe o inquérito policial, prevalece que a Constituição Federal estabelece os contornos de um sistema acusatório, que é nitidamente mais democrático e cujas características compõem boa parte dos princípios processuais penais constitucionais.
faça valer a pena
Questão 1
O termo inicial da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, ainda que pendente de apreciação recurso interposto pela defesa que, em face do princípio ________________, impeça a execução da pena. Isso porque o art. 112, I, do CP (redação dada pela Lei 7.209/1984) dispõe que a prescrição, após a sentença condenatória irrecorrível, começa a correr “do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação [...]”. (FAGA, 2014, p. 734)
Complete a alternativa que apresenta um princípio Processual Penal.
Correto!
O princípio do Estado de inocência também conhecido como princípio da presunção de inocência ou presunção de não culpabilidade e é um princípio reconhecido na Constituição Federal, no artigo 5º, LVII, segundo o qual ninguém pode ser considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Individualização da pena, legalidade, ofensividade e subsidiariedade também são princípios constitucionais, mas só se aplicam ao direito penal.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Questão 2
"Deve a acusação ser portadora de elementos – geralmente extraí¬dos da investigação preliminar (inquérito policial) – probatórios que justifiquem a admissão da acusação e o custo que representa o processo penal em termos de estigmatização e penas processuais. Caso os elementos probatórios do inquérito sejam insuficientes para justificar a abertura do processo penal, deve o juiz rejeitar a acusação.”
Considere as seguintes assertivas sobre o inquérito policial e marque quais estão corretas:
- É procedimento necessário para o oferecimento da denúncia.
- É procedimento que deve ser feito de forma escrita.
- É inquisitivo, isto é, não haverá, de regra, ampla defesa e contraditório.
- O sigilo do inquérito, que se aplica ao advogado do investigado, serve para que o criminoso não se antecipe à acusação e fuja de sua responsabilidade.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Correto!
O inquérito policial é procedimento dispensável para oferecimento da inicial acusatória. O caráter escrito do processo penal está no art. 9º do CPP. É inquisitivo e, portanto, não há ampla defesa e contraditório e o sigilo não é imposto ao advogado, servindo, na verdade, para evitar sensacionalismos com o nome de eventual inocente.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Questão 3
Historicamente, há, como regra, três sistemas regentes do processo penal: a) inquisitivo; b) acusatório; c) misto. Entretanto, convém, desde logo, mencionar que, na atualidade, eles jamais conseguiram ser adotados, integral e individualmente, por um único ordenamento jurídico. Há vantagens de um que, associadas aos aspectos positivos de outro, constroem o mais apurado método de persecução penal (NUCCI, 2021, p. 38).
Quanto aos sistemas processuais ao longo da história, o sistema _________ é marcado pelo cúmulo de funções nas mãos de um único agente processual. Já no sistema _______ as funções são plenamente distribuídas. Ademais, no sistema ________ a tortura para obtenção da confissão e a sigilosidade do procedimento eram a regra, enquanto que no sistema ________ o livre convencimento motivado e a publicidade costumam reinar. No Brasil, embora alguns autores afirmem que adotamos um sistema ______, tende a prevalecer que a Constituição Federal adotou os contornos de um sistema _________.
Marque a alternativa que corresponde aos espaços na assertiva:
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Correto!
O sistema inquisitivo é caracterizado pela concentração de poderes e de funções processuais nas mãos do juiz que também atua como acusador e defensor. A confissão do réu é considerada a “rainha das provas” e, por isso, mais valiosa que qualquer outra, sendo permitido até mesmo a tortura para obtê-la. O procedimento normalmente se dá de forma secreta e não é marcado pelo contraditório ou pela ampla defesa. O sistema acusatório tem clara separação entre acusação, defesa e julgador. Os procedimentos apresentam mais oralidade e publicidade, há contraditório e ampla defesa, um sistema de livre convencimento motivado na produção de provas e isonomia entre as partes. Um sistema misto combinaria as características ou teria uma fase plenamente inquisitiva seguida de uma fase acusatória.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
Tente novamente...
Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.
referências
ALVES, L. B. M. Processo penal, parte geral. 6. ed. Salvador: Juspodivm, 2016.
BITENCOURT, C. R. Tratado de direito penal. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2020.
BITTAR, N. Medicina legal e noções de criminalística. 9. ed. Salvador: Juspodivm, 2020.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://bit.ly/3nfGRws. Acesso em: 5 jul. 2021.
BRASIL. DECRETO No 678, de 6 de novembro de 1992 (Pacto de São José da Costa Rica). Disponível em: https://bit.ly/2YsyP8T. Acesso em 07 set 2021.
BRASIL. DECRETO-LEI Nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). Disponível em: https://bit.ly/3hftN6b. Acesso em: 7 set. 2021
BRASIL. LEI Nº 8.906, DE 4 DE JULHO DE 1994 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)). Disponível em: https://bit.ly/3hgnD5T. Acesso em 07 Set. 2021
BUSATO, P. C. Direito Penal. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2018.
CUNHA, R. S. Manual de direito penal. Salvador: Juspodivm, 2020.
DEZEM, G. M. Curso de processo penal. 6 ed. São Paulo: Thomson Reuteurs Brasil, 2020.
ESTEFAM, A. Direito penal esquematizado. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
FAGA, T. R. T. (Org.). Vade Mecum de Jurisprudência: STF e STJ. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO: 2014. Disponível em: https://bit.ly/38XcxxX. Acesso em: 8 set. 2021.
GRECO, R. Curso de direito penal: parte especiaI. 15 ed. Niterói: Impetus, 2018.
JUNIOR, A. C. L. L. Fundamentos Processo Penal. (7th edição). Editora Saraiva, 2021. Disponível em: https://bit.ly/3BRgFfx. Acesso em 8 set. 2021.
LIMA, R. B. Legislação criminal especial comentada. Salvador: Juspodivm, 2020.
LOPES JR., A. Direito processual penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
NUCCI, G. S. Curso de direito processual penal. 18. ed. Grupo GEN, 2021. Disponível em: https://bit.ly/3DYBYxr. Acesso em 8 set. 2021.
OLIVEIRA, E. P. Curso de processo penal. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
PRADO, L. R. Curso de direito penal brasileiro. 16. ed. São Paulo: Thomson Reuters, 2018.