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Quais os principais tipos de pesquisa?

Douglas Rodrigues Aguiar de Oliveira

Fonte: Shutterstock.

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Convite ao estudo  

Caro aluno,

Veja como a ciência está em todos os lugares. Hoje, ela é um dos elementos mais básicos em todos os aparatos tecnológicos, como no celular, na televisão, no computador e, principalmente, nos dispositivos de GPS.

No entanto, todos esses aparatos tecnológicos não surgiram do nada. Essas tecnologias são produtos de investigações científicas mais elementares, principalmente com base no estudo com partículas elementares, estudo exige a adoção de um método para avaliar o nível de verdade das hipóteses e das teorias.

Esse é o método científico. Embora muito pouco compreendido, ele também nos auxilia na hora de avaliarmos afirmações que nos parecem duvidosas, como quando vamos avaliar a existência de evidência para alguma substância ou terapias que nossos amigos e familiares nos recomendaram para um problema específico.

Devido ao fato desse momento único na história ser altamente dependente da ciência e tecnologia, é necessário entendermos como o conhecimento científico é produzido, quais passos nos levam cada vez mais próximos à verdade e, principalmente, quais os limites desse tipo único de conhecimento – é isso que veremos ao longo desta unidade. 

Praticar para aprender

Você sabe o que é o método científico? Talvez você já deve ter pensado que é uma fórmula secreta para produzir conhecimento científico. Uma sugestão para essa resposta é geralmente apresentada em diagramas e infográficos, que reduzem a concepção de método científico a algo análogo a uma receita de bolo, porém, isso não é uma representação fidedigna do método científico nem representa o grau mais elementar da pesquisa científica.

O método científico, que será apresentado ao longo do livro, deve ser visto como um conjunto de procedimentos teóricos, experimentais e, principalmente, éticos, que podem ser usados não apenas na ciência, mas na filosofia, tecnologia e até mesmo na vida cotidiana para a resolução de problemas.

Um exemplo de aplicação do método científico na vida cotidiana para avaliação de um problema é na hora de averiguar a plausibilidade da reivindicação de um farmacêutico que tenha como objetivo vender um produto homeopático ou qualquer tipo de medicina alternativa. Para isso, seria necessário apenas um celular com acesso à internet para consultar – especialmente, na base de dados de um periódico de medicina baseada em evidências – estudos de revisão de literatura científica, com o objetivo de extrair da conclusão a resposta mais adequada para contrastar com a reivindicação do farmacêutico. Suponha-se, para fins didáticos, que o farmacêutico tenha afirmado que a homeopatia é recomendada para a gripe, sobretudo, para melhorar o sistema imunológico, enquanto que o estudo de revisão aponta que, com base na avaliação de 500 estudos randomizados e com controle de placebo, a homeopatia não tenha apresentado nenhum efeito clínico significativamente estatístico. A partir dessa informação, você pode desconsiderar a afirmação do farmacêutico e, consequentemente, evitar que seu dinheiro seja desperdiçado com homeopatia e outros tipos de pseudomedicinas.

Porém, existem diversas outras formas de avaliar certas reivindicações, principalmente com base na realização de pesquisas experimentais. Devido à abrangência dos diferentes tipos de técnicas e metodologias científicas, bem como de sua importância na vida cotidiana, convido-lhe a mergulhar no processo de construção do conhecimento, analisando suas diferentes abordagens na solução de problemas.

Um grupo de cientistas quer investigar os possíveis efeitos da homeopatia no organismo de pessoas com gripe. Para isso, o grupo decidiu fazer uma pesquisa exploratória - especialmente um ensaio observacional.

Os cientistas selecionaram cerca de 20 voluntários gripados para ingerir doses de comprimidos homeopáticos. Cerca de 4 horas após a ingestão de substâncias homeopáticas, os pesquisadores perguntam aos voluntários o que eles sentem. Todos eles, sem exceção, relataram algum nível de melhoria em sua condição de saúde.

Então, os pesquisadores encerram o experimento e escrevem suas descobertas em trabalho formalizado e, consequentemente, submetem para uma revista científica.

Tendo como base a descrição desse tipo de experimento, é seguro afirmar que ele foi bem conduzido?

O método científico é comprovado e verdadeiro. Não é perfeito, é apenas o melhor que temos. Abandoná-lo, junto com seus protocolos céticos, é o caminho para uma idade das trevas." 

Carl Sagan

conceito-chave

Tipos de pesquisas científicas

Há diversos tipos de pesquisas científicas, cada qual com seus objetivos, particularidades e, principalmente, objetos de estudos. A diversidade da pesquisa científica permite estudar diversos problemas, da origem do Universo ao comportamento humano, também permite estudar um mesmo problema sob diferentes perspectivas metodológicas, com o objetivo de enriquecer o conhecimento científico, proporcionando uma visão de mundo mais ampla e consistente com as evidências científicas.

Por causa dessa ampla variedade metodológica de pesquisas, uma consequência inevitável é o investimento diversificado para cada tipo de pesquisa, de modo que um físico experimental, por conta da necessidade de instrumentação adequada e a necessidade de exportar ainda mais ferramentas para empreender sua pesquisa, acaba recebendo mais verba para sua pesquisa do que um filósofo ou sociólogo literário, que desenvolve pesquisas de cunho teórico, geralmente revisando a literatura acadêmica vigente para desenvolver seu trabalho.

Isso, no entanto, contribui para uma visão valorativa incorreta da ciência - especialmente pela crença de que maior investimento em uma ciência é um critério que define sua qualidade metodológica ou seu nível de importância. Um exemplo didático que refuta essa concepção equivocada da ciência é dado por cientistas e filósofos, que desenvolveram pesquisas bibliográficas que tinham como objetivo analisar a metodologia de estudos da psicologia evolutiva sobre a questão da divisão do trabalho, diferenças de gêneros e, sobretudo, desigualdades sociais.

Esse tipo de estudo da psicologia evolutiva tem tido ampla repercussão e tem sido considerado útil em decisões políticas que envolvem a possibilidade de rejeitar a implementação de políticas públicas. Uma ideia constantemente propagada para reforçar a posição contrária às políticas sociais é de que a pobreza e a desigualdade social estão nos genes, de que políticas sociais são inúteis e que o quociente de inteligência (Q.I.) é determinado pela genética. No entanto, diversos cientistas e filósofos têm argumentado amplamente contra a metodologia desses estudos dizendo que “são apenas histórias”, ou seja, que não possuem qualquer tipo de correspondência empírica entre a hipótese e a afirmação do qual os proponentes do campo defendem. Por causa dos críticos da psicologia evolutiva que enfatizaram sobre o possível impacto da implementação de ideias “evolutivas” no âmbito político, os cientistas e filósofos contribuíram para reforçar a importância das ciências sociais – mesmo com o campo recebendo pouca verba para a pesquisa e sendo constantemente ameaçado por ideólogos e pseudocientistas.

Os tipos diversificados de pesquisas científicas incluem a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental, a pesquisa de campo, a pesquisa de laboratório, a pesquisa qualitativa, a pesquisa quantitativa, a pesquisa exploratória, a pesquisa descritiva e a pesquisa explicativa. Cada tipo de pesquisa tem sua importância dentro da ciência, mas elas também podem ser conduzidas em outros campos de conhecimento, como na filosofia, no jornalismo e, principalmente, na tecnologia - especialmente nas tecnologias sociais, como a administração, o direito e a pedagogia.

A pesquisa bibliográfica, utilizada amplamente em estudos de revisões de literatura científica, refere-se a um tipo de estudo que busca consultar amplas bases de dados, sobretudo indexadores de artigos científicos e livros-textos com o objetivo de procurar saber o quanto um problema já foi estudado e o quão significativo é a sua evidência. Um exemplo prático desse tipo de estudo é quando o objetivo do pesquisador é identificar a reivindicação de eficácia de alguma terapia ou técnica médica para algum problema de saúde. O pesquisador, dessa maneira, consulta a base de dados, filtra os resultados de buscas, escolhe os estudos, analisa suas discrepâncias metodológicas, emprega uma técnica estatística adequada e extraí a porcentagem de evidência resultante da revisão dos estudos selecionados. Digamos, por exemplo, que o cálculo estatístico, após a análise dos estudos selecionados, revelou que a acupuntura não produziu nenhum efeito clínico estatístico significativo para o tratamento da dor lombar. Então, o autor adiciona sua metodologia, procedimento e conclusão em sua pesquisa bibliográfica.

A pesquisa documental é amplamente utilizada na história, porque ela envolve a investigação primária de algum fenômeno ou ocorrência do passado com base na coleta de documentos, livros, testamentos, gravações, fotografias, cartas, artefatos e mais outras coisas das quais seriam úteis na condução da investigação. Ela também tem aplicação no âmbito da investigação forense, contribuindo para a solução de crimes com base na sua metodologia de extração de dados com o objetivo de fornecer a melhor evidência para o julgamento criminal.

A pesquisa de campo é importante para estudar fenômenos naturais e climáticos, como a atividade vulcânica em uma área geologicamente ativa, coletando rochas vulcânicas na área de ocorrência do evento com o objetivo de estudar sua estrutura, composição e sua possível utilidade para prever a ocorrências de novas erupções vulcânicas. Esse tipo de pesquisa também tem utilidade na solução de acidentes tecnológicos, contribuindo, por exemplo, para decifrar a causa de acidentes aéreos ao analisar o local da queda.

A pesquisa de laboratório é uma forma de estudar problemas de forma direta, com o objetivo de produzir ou reproduzir pequenas condições em seu objeto de estudo e avaliar suas possíveis implicações, como para testar a efetividade de uma vacina em camundongos ou mesmo para reproduzir as circunstâncias ambientais da Terra primitiva com o objetivo de estudar a origem da vida. Esse tipo de pesquisa também é empregado no campo da tecnologia, com o objetivo de produzir e testar a segurança dos organismos geneticamente modificados.

A pesquisa quantitativa visa a implementação de ferramentas estatísticas para quantificar os dados e resultados alcançados após a investigação de um fenômeno ou problema da realidade. Nesse tipo de estudo, também utilizado em ciência social, os pesquisadores podem utilizar estatística inferencial e deduzida, bem como modelagem computacional para prever a ocorrência de um fenômeno em termos quantificáveis, como crises econômicas, desigualdades sociais e o impacto da implementação de uma política pública.

A pesquisa qualitativa é aplicada que não há necessidade de empregar ferramentas estatísticas. Ela pode ser aplicada em psicologia através de questionários para entender o comportamento de uma dada população, por exemplo, analisando a atitude das pessoas ao decorrer da pandemia de coronavírus.

A pesquisa exploratória é uma abordagem inicial para o estudo de um problema ou fenômeno da realidade. Esse tipo de pesquisa não tem como objetivo proporcionar um conhecimento aprofundado sobre qualquer coisa. Na sua aplicação na área da saúde, por exemplo, os pesquisadores utilizam poucos voluntários, uma amostragem pouco ou nada representativa da população, para testar algum novo medicamento ou terapia. Essa pesquisa serve de base para outras mais aprofundadas e pode ser facilmente conduzida por alunos de iniciação científica ou estagiários de laboratórios.

A pesquisa descritiva tem como objetivo interpretar e mapear a ocorrência de um fenômeno com base em técnicas de observação e análise de dados. Ela pode ser empregada no estudo de eventos astronômicos, como supernovas, com o objetivo de estabelecer as condições iniciais do fenômeno e relacionar variáveis para chegar à melhor interpretação dos dados.

A pesquisa explicativa busca estabelecer um conhecimento avançado sobre um fenômeno natural ou social procurando explicar sua origem, evolução e impacto na realidade. Nesse tipo de pesquisa, o pesquisador busca analisar a compatibilidade de uma ideia com o conhecimento do momento, emprega pesquisas empíricas e tenta explicar as causas de um evento. No caso das ciências naturais, por exemplo, esse evento pode ser a evolução das espécies, com pesquisadores engajados em fornecer a melhor explicação dos mecanismos envolvidos na transmissão de genes entre parentescos e sua implicação no comportamento humano. No caso das ciências sociais, por exemplo, um típico evento estudado são as crises econômicas, com cientistas tentando identificar as variáveis importantes do sistema político-econômico do momento a fim de prever quais razões poderiam levar um país ao colapso financeiro.

Cada tipo de pesquisa tem sua importância e utilidade, de modo que elas não podem ser vistas com base numa visão hierárquica. Todos esses tipos de pesquisa auxiliam a ciência, ajustando as teorias à realidade e, até mesmo, proporcionando um amplo conhecimento sobre problemas que ainda não foram explorados.

Assimile
  1. Existem diversos tipos de pesquisas científicas, cada uma com um objetivo específico, que são igualmente importantes para a construção de conhecimento científico.
  2. Existem diversos modelos de métodos científicos. Entre eles, se destacam o método hipotético-dedutivo, a falseabilidade popperiana e a concepção bungeana.
  3. O anarquismo epistemológico, cuja a posição é exposta na máxima “tudo vale” ou “qualquer coisa serve”, é incompatível com a investigação científica.

Métodos científicos

O “método científico” é um conceito difícil de definir, embora seja constantemente tratado de forma incorreta e, às vezes, pejorativa. Na literatura filosófica do século XX, por exemplo, o método científico chegou a ser considerado como um mito, como um elemento não existente na investigação científica, de modo que essa visão inspirou a ideia de que a ciência é um campo onde “tudo vale” ou “qualquer coisa serve”, tratando a ciência como um terreno baldio e equivalente a crenças religiosas, superstições e pseudociências. Essa foi uma visão inspirada no filósofo austríaco Paul Feyerabend que foi considerada como razoável em determinados setores das humanidades, bem como no campo da filosofia da ciência, mas incorreta sobre a ciência e o método científico.

Outras visões de método científico, embora incorretas, também ganharam uma ampla aceitação nos setores mais atrasados da ciência básica; em particular, duas visões tiveram uma ampla aceitação: a visão de que a ciência funciona mediante a aplicação do método indutivo. 

Karl Popper foi um dos filósofos mais críticos desse pensamento que buscava comprovar teorias mediante a observação ou coleta de dados particulares. Isto é, digamos que um pesquisador tenha observado um grupo de ursos pretos numa floresta e, então, tenha deduzido uma regra geral de que todos os ursos são pretos. Uma observação de um urso polar no continente antártico, portanto, falsearia a proposição de que “todos os ursos são pretos”, o que levaria a um problema epistemológico, conhecido como problema da indução. Popper, então, estabeleceu que o que determina as condições de cientificidade não é a observação particular da suposta regularidade de um evento, mas a falseabilidade de uma hipótese ou teoria científica, ou seja, a hipótese ou teoria científica deveria ter consequências das quais fossem possíveis de extrair sua refutação. 

O exemplo que corrobora com o modelo de Popper é fornecido pelo próprio naturalista inglês Charles Darwin, em seu livro A Origem das Espécies, que descreve que sua teoria da evolução poderia ser falseada, caso alguém conseguisse demonstrar que algum órgão complexo existiu e que não poderia ter sido formado por leves modificações numerosas e sucessivas ao longo do tempo.

Popper propõe o método hipotético-dedutivo que, em síntese, passa pelas seguintes etapas:

  1. Elaboração do problema (decorrente, muitas vezes, de conflitos de teorias existentes).
  2. Construção de um modelo teórico (em que há a formulação das hipóteses centrais).
  3. Tentativa de falseamento das hipóteses por meio da observação e da experimentação.

Caso a hipótese não seja verificada por meio dos testes, ela estará falseada, exigindo uma nova reformulação da hipótese ou do problema. Caso ela se supere os testes rigorosos, então ela estará parcialmente confirmada, mesmo que provisoriamente. 

Embora o critério de Popper estivesse alinhado a algumas características das teorias científicas, como no caso da própria teoria da evolução, ele era insuficiente para demarcar a ciência de qualquer atividade não científica, na qual inclui não apenas a filosofia, mas também a pseudociência. Um exemplo é fornecido pelo filósofo Mario Bunge, em sua obra Pseudociência e Ideologia, que argumenta que levar em consideração a falseabilidade, enquanto critério de demarcação, exigiria considerar todas as teorias falsas como científicas, e também exigiria descartar teorias científicas de alto nível que não são falseáveis, como a Teoria Geral dos Campos e a Teoria Geral da Informação, que, sendo tão gerais, só podem ser testadas indiretamente por meio de sua especificação.

Em resposta às propostas simplistas de cientificidade, Bunge desenvolveu sua própria tese, distinguindo o critério de demarcação do modelo de método científico. Para Bunge, o que demarca a ciência de outros campos cognitivos, como a filosofia e a pseudociência, é a presença de uma comunidade de pesquisadores, uma sociedade tolerante à atividade científica, o domínio sobre entidades reais, uma base filosófica (envolvendo a pressuposição de que [a] o mundo é composto de coisas concretas que mudam, segundo leis, [b] uma epistemologia realista, [c] um sistema de valores que enaltece a claridade, a exatidão, a profundidade, a coerência e a verdade, [d] e o ethos da busca livre da verdade), uma base formal (coleção de teorias lógicas ou matemáticas do momento), uma base específica (coleção de dados, hipóteses e teorias do momento), uma problemática (problemas cognitivos relativos à natureza dos objetos concretos), um fundo de conhecimento (específico e acumulado), objetivos racionais (descobrir ou utilizar leis, sistematizar hipóteses e refinar métodos), uma metódica bem delineada (procedimentos verificáveis e justificáveis) e um campo cognitivo sendo componente de um campo de conhecimento mais abrangente.

Bunge considerou o método científico como sendo um conjunto de procedimentos gerais mutáveis, ajustados para cada problema e objeto estudado, constando com (a) a identificação de um problema envolvendo o reconhecimento de um fato, a descoberta de um problema e, em seguida, a formulação do problema; (b) a construção de um modelo teórico envolvendo a seleção de fatores pertinentes do problema, a invenção de hipóteses centrais e suposições auxiliares e, principalmente, tradução matemática; (c) a dedução de características particulares envolvendo a busca por suportes racionais e empíricos, (d) a demonstração da prova ou evidência da hipótese envolvendo a representação e execução da prova ou evidência, a elaboração de dados e a inferência da conclusão; (e) a introdução das consequências na teoria envolvendo a comparação das conclusões com as predições e o reajuste de modelo; e (f), finalmente, a sugestão referente ao trabalho anterior.

Essas características apresentadas por Bunge também rompem com concepções que levavam em consideração a unidade do método científico como sendo algo imutável, ou mesmo semelhante a uma receita de bolo para produzir conhecimento. Para Bunge, o método científico, mesmo sendo único e universal, deve ser visto como um conjunto de procedimentos amplos que mudam conforme o tempo e se ajustam a cada ciência em particular, de modo que a forma como os biólogos investigam microrganismos não envolve o emprego das mesmas técnicas de investigação utilizadas pelos sociólogos para estudar comportamentos sociais ou crises econômicas. De fato, há algumas exceções, como o uso de ferramentas matemáticas e lógicas semelhantes, bem como a atitude de busca pela verdade e admissão de cognoscibilidade da realidade, mas não é como advogam os naturalistas metodológicos, que defendem que o método das ciências naturais deve ser o mesmo das ciências sociais. Essa proposta também rompe com o anarquismo epistemológico de Feyerabend, a ideia segundo a qual não existiria um método científico e universal, pois Bunge reconhece que ele existe e pode ser – e está sendo – aplicado para estudar problemas cognitivos, bem como todos os objetos existentes da realidade, como partículas, elementos químicos, moléculas, planetas, estrelas, supernovas, microrganismos, cérebros, consciência, comportamento, sociedade, ética, experiência estética, artes, cultura, política, linguagem, economia, filosofia e muitas outras coisas, como a própria ciência (sociologia da ciência ou ciência da ciência), diferente da crença falsa compartilhada em diversos campos das humanidades.

Reflita
  1. O que torna o método científico uma abordagem confiável?
  2. Qual a importância das revisões sistemáticas no contexto das investigações científicas na área da saúde?
  3. Quais elementos contribuem para a objetividade científica?

Pesquisa com pesquisa: metanálises e revisões

Nenhuma pesquisa individual é suficiente para conduzir ou representar uma verdade no mundo, pois ela pode estar sujeita a falhas metodológicas, vieses cognitivos e fraudes intencionais. Também pode ser o caso de um estudo individual ser conduzido sem um grupo de controle adequado para avaliar de forma rigorosa a efetividade um medicamento ou terapia. Talvez um estudo individual não tenha uma amostragem suficientemente representativa para a população, ou pode ser que os animais utilizados para um determinado experimento tenham predisposição a alguma doença, de modo que um teste experimental poderia não representar fielmente as possíveis consequências da ingestão de uma determinada substância. Nesse contexto, entra a importância de conduzir mais experimentos com o objetivo de tentar reproduzir os mesmos resultados – a tal chamada “reprodutibilidade”.

Na reprodutibilidade, ocasionalmente, ocorre de os cientistas chegarem a resultados discrepantes do estudo original. Na verdade, tem-se argumentado que a ciência está enfrentando uma crise de reprodutibilidade por conta das divergências nos resultados experimentais alcançados por pesquisadores independentes ao tentarem replicar experimentos anteriores. Por causa dessas diferenças nos resultados experimentais e, principalmente, nas potenciais falhas metodológicas dos diversos estudos científicos desenvolvidos ao longo dos anos, tornou-se necessária a utilização de estudos de revisão sistemática para avaliar a qualidade da evidência produzida ao longo da análise de dezenas, centenas ou mais de artigos científicos.

Esses estudos de revisão sistemática são extremamente importantes no campo da medicina, porque, com base neles, é possível identificar potenciais falhas, vieses e limitações nos estudos realizados até o momento, contribuindo para fornecer uma visão sobre o estado atual das coisas, como para identificar a qualidade e o nível da evidência produzida até o momento. Em resumo, a revisão sistemática é um tipo de pesquisa secundária com o objetivo de reunir estudos semelhantes, publicados ou não, a fim de avaliá-los criticamente e, quando possível, reuni-los numa ampla análise estatística, chamada metanálise.

A metanálise é uma técnica estatística utilizada para combinar resultados oriundos de diferentes estudos, geralmente aplicada na revisão sistemática. A metanálise ajuda a extrair resultados estatísticos com base na análise geral dos estudos. No entanto, a revisão sistemática pode ser feita de forma independente das técnicas estatísticas, pois não é sempre possível e nem mesmo adequado aplicá-las em todos os casos. 

Existem diversos estudos com medicina alternativa indexados no repositório do PubMed, revelando possíveis efeitos benéficos à saúde humana, mas isso não significa que esses estudos tenham sido bem conduzidos. Na verdade, existir um estudo não significa que ele seja bom nem que seja “científico”, pois a pseudociência também produz estudos, embora de baixa qualidade, sem o controle adequado, mergulhado em vieses cognitivos e, às vezes, até com indícios de falsificações. Esse é o caso das medicinas alternativas, como acupuntura, homeopatia, quiropraxia, naturopatia, ozonoterapia, antroposofia, reiki, cura quântica, hidroterapia de cólon e, principalmente, psicanálise, que são exemplos típicos de pseudociências, pseudoterapias ou pseudotecnologias, que negligenciam os resultados extraídos das revisões sistemáticas, que normalmente revelam que elas não produzem nenhum efeito estatisticamente significativo, exceto efeitos placebos – que não são causados pela suposta eficácia da medicina alternativa, mas simplesmente por conta do estado psicológico do paciente, bem como de sua relação de confiança com seu médico. Efeitos placebos também não curam absolutamente nada, ao contrário da crença equivocada amplamente divulgada pelos “médicos alternativos”, o efeito placebo está relacionado simplesmente ao alívio de sintomas subjetivos, como dor, por exemplo.

As revisões sistemáticas, com ou sem abordagem metanalítica, são necessárias até mesmo na elaboração de políticas públicas baseadas em evidências, pois, com base nelas, podemos guiar o financiamento para técnicas e terapias realmente eficazes, evitando o desperdício de dinheiro público com medicina alternativa e oferecendo o melhor tratamento disponível à população. Em resumo, as revisões sistemáticas produzem o tipo mais confiável de evidência científica e podem ser guias úteis em nossas escolhas da vida cotidiana, principalmente quando estamos procurando cuidados médicos.

Estrutura e elementos

O método científico é a estrutura geral da ciência moderna, de modo que não é possível conceber uma ciência sem método. No entanto, ainda existem mais algumas particularidades, por exemplo, a estrutura do método científico é ordenada logicamente, o que significa que é permitido contradição. Consequentemente, a dialética, por violar o princípio da não contradição, não faz parte da ciência nem do método científico.

Essa estrutura permite que o método científico, enquanto um conjunto de procedimentos teóricos, experimentais e éticos, seja aplicado na ciência com o objetivo de fornecer a melhor explicação da realidade. Uma consequência inevitável é que a estrutura do método requer um nível de compatibilidade das hipóteses com as teorias mais bem confirmadas do momento, o que significa que uma hipótese deve estar em concordância com as leis que regem o mundo, portanto, hipóteses sobre a existência de almas, espíritos ou instâncias psíquicas psicanalíticas, por conflitarem com o princípio de conservação de energia das leis da termodinâmica, não são científicas, mas pseudocientíficas.

O método científico também faz uso de elementos ou símbolos formais, de modo que é possível aplicar ferramentas da lógica e da matemática para extrair das proposições a melhor precisão e objetividade possível, evitando, dessa forma, a ambiguidade da linguagem ordinária e, principalmente, a armadilha da polissemia com certos conceitos. Além disso, adoção de certos elementos ou símbolos formais refuta a crença de que não existe objetividade na ciência.

Mesmo na construção de hipóteses científicas, esses elementos são adicionados ou incrementados com o objetivo de analisar logicamente a compatibilidade das proposições com a conclusão. Mas isso não é uma coisa exclusiva da ciência, pois, atualmente, a filosofia científica é desenvolvida com essas mesmas ferramentas formais e aplica o método científico para avaliar hipóteses filosóficas pela compatibilidade com o conhecimento científico do momento.

O entendimento claro, preciso e profundo do conhecimento científico, bem como a capacidade de comunicar descobertas científicas em diversos países e línguas, é o que revela o aspecto de objetividade da ciência, que não é apenas possível, mas desejável para evitar a confusão e o autoengano. O que não devemos fazer é cair no erro de pensar que objetividade é sinônimo de neutralidade, pois a ciência advoga por princípios éticos de busca pela verdade, racionalidade, humanismo e comprometimento com a investigação da realidade mediante contribuição da comunidade científica. Além disso, os cientistas podem ser inspirados por posições pessoais, bem como políticas, ideológicas e religiosas, de modo que essas posições possam contribuir com alguma nova ideia para resolver um problema. Então, a ciência não é neutra, mas isso não significa que as ideologias pessoais dos cientistas determinem o que é verdade, pois a ciência, enquanto comunidade, advoga por princípios éticos que neutralizam as preferências individuais dos pesquisadores. Daí a importância das revisões sistemáticas e da reprodutibilidade na ciência, pois são formas de identificar exceções das quais as intenções pessoais sobrepuseram à vontade coletiva da comunidade científica pela verdade.

Exemplificando
  1. O método científico não é uma receita de bolo para produzir conhecimento, mas um conjunto de procedimentos teóricos, experimentais e éticos que auxiliam na investigação de um problema.
  2. O método científico pode ser aplicado não apenas na ciência, mas também na filosofia e na vida cotidiana.
  3. As ferramentas formais da matemática e da lógica contribuem para que a ciência mantenha sua objetividade e exatidão, evitando as armadilhas da linguagem ordinária e a subjetividade interpretativa.

Como foi apresentado, existem diversos tipos de pesquisas científicas que norteiam a ciência, cada qual com sua importância e aplicação para o estudo de um problema específico. A pluralidade de investigação permite a extração de um conhecimento mais amplo sobre a realidade mediante uso de método científico. No entanto, o conceito de método científico é pouco claro, de modo que diversas tentativas de modelos foram apresentadas ao longo da história da ciência e da filosofia com o objetivo de classificá-lo, sendo os mais conhecidos o Método Hipotético-Dedutivo (inspirado na indutivismo do filósofo Francis Bacon), a Falseabilidade do filósofo da ciência Karl Popper e a Concepção Sistêmica da Ciência, do físico e filósofo científico Mario Bunge. Embora a ciência leve em consideração um conjunto de procedimentos teóricos, experimentais e éticos ao longo de sua investigação e construção de conhecimento, existem diversas ferramentas formais que contribuem para sua melhor objetividade, evitando as armadilhas da linguagem ordinária e a subjetividade interpretativa.

Faça valer a pena

Questão 1

O campo de conhecimento responsável em estudar a ciência, incluindo seus limites e o próprio método científico. Também busca analisar as distinções entre ciência e pseudociência com o objetivo de resolver o problema da demarcação.

Qual o nome da disciplina responsável pela tarefa descrita no enunciado?

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Correto!

A filosofia da ciência é um ramo da filosofia preocupada com os fundamentos, métodos, implicações e limites da ciência. As discussões centrais se referem ao que podemos considerar como ciência, bem como sobre o problema a respeito da confiabilidade das teorias científicas e da importância do critério de demarcação entre ciência e pseudociência.

Questão 2

Pesquisa conduzida por cientistas e tecnólogos, geralmente em ambiente controlado, que tem a intenção de estudar microrganismos, camundongos ou simplesmente o próprio ambiente da Terra primitiva.

Assinale o tipo de pesquisa descrita no enunciado.

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Correto!

A pesquisa de laboratório ou laboratorial é um tipo de pesquisa que visa estudar problemas de forma direta, com o objetivo de produzir pequenas condições em seu objeto de estudo e avaliar suas possíveis implicações em algum cenário de interesse particular para os cientistas envolvidos. Esse tipo de pesquisa também é adotado no campo da tecnologia, especialmente no desenvolvimento de vacinas e de organismos geneticamente modificados.

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Questão 3

Um tipo de pesquisa que visa extrair diversos estudos semelhantes para avaliar o nível de evidência de uma intervenção específica que pode usar uma técnica estatística de metanálise para quantificar os dados, sendo essencial para avaliar reivindicações no campo da saúde.

Assinale o nome desse tipo de pesquisa.

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Correto!

Uma revisão sistemática é um tipo de estudo de revisão da literatura científica que utiliza métodos sistemáticos para coletar dados secundários, avaliar criticamente os estudos de pesquisa e sintetizar as descobertas de forma qualitativa ou quantitativamente. No último caso, esse tipo de estudo utiliza uma técnica estatística, chamada de metanálise.

Tente novamente...

Esta alternativa está incorreta, leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar outra vez.

Referências

BUNGE, M. La Ciencia, su Método y su Filosofía. [S.L.]: Editora Sudamericana, 2014.

BUNGE, M. Las pseudociencias ¡vaya timo! 2. ed. [S.L.]: Editora Laetoli, 2014.

BUNGE, M. Seudociencia e ideología. [S.L.]: Editora Alianza, 1986.

FEYERABEND, P. Contra o Método. 2. ed. [S.L.]: Editora Unesp, 2011.

POPPER, K. A Lógica da Pesquisa Científica. 2. ed. [S.L.]: Editora Cultrix, 2013.

Bons estudos!

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