Comentários

0%

FOCO NO MERCADO DE TRABALHO

MARCO CIVIL DA INTERNET E HERANÇA DIGITAL

Luiz Felipe Nobre Braga

Fonte: Shutterstock.

Deseja ouvir este material?

Áudio disponível no material digital.

sem medo de errar

Diante do caso exposto, fica evidente a violação do princípio da neutralidade da rede. Esse princípio disciplina que as empresas que fornecem Internet devem tratar o acesso a todos os conteúdos de forma igual, tornando absolutamente proibido discriminar os usuários, conforme orienta o art. 9 da Lei do Marco Civil, in litteris:

Art. 9° O responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação.
§ 1° A discriminação ou degradação do tráfego será regulamentada nos termos das atribuições privativas do Presidente da República previstas no inciso IV do art. 84 da Constituição Federal, para a fiel execução desta Lei, ouvidos o Comitê Gestor da Internet e a Agência Nacional de Telecomunicações, e somente poderá decorrer de:
I – requisitos técnicos indispensáveis à prestação adequada dos serviços e aplicações; e
II – priorização de serviços de emergência.
§ 2° Na hipótese de discriminação ou degradação do tráfego prevista no § 1°, o responsável mencionado no caput deve:
I – abster-se de causar dano aos usuários, na forma do art. 927 da Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil;
II – agir com proporcionalidade, transparência e isonomia;
III – informar previamente de modo transparente, claro e suficientemente descritivo aos seus usuários sobre as práticas de gerenciamento e mitigação de tráfego adotadas, inclusive as relacionadas à segurança da rede; e
IV – oferecer serviços em condições comerciais não discriminatórias e abster-se de praticar condutas anticoncorrenciais.
§ 3° Na provisão de conexão à Internet, onerosa ou gratuita, bem como na transmissão, comutação ou roteamento, é vedado bloquear, monitorar, filtrar ou analisar o conteúdo dos pacotes de dados, respeitado o disposto neste artigo. 

(BRASIL, 2014, p. 2)

Desse modo, tendo em vista as diversas solicitações e os agendamentos para a visita do técnico, que foram negados, e o atendimento quase imediato do vizinho, com oferecimento de pacote de dados superior, verifica-se que houve clara discriminação no serviço por parte da empresa provedora. No caso em tela, há um conceito que referencia bem o fato: trata-se da discriminação por pacotes de dados, decorrente da priorização de serviços de emergência.

Avançando na prática

O provedor e o usuário

Um casal de namorados, que trocava fotos íntimas por meio da Internet, teve suas imagens vazadas nas próprias redes sociais. As imagens e os vídeos ficaram disponíveis durante horas até que alguns amigos e familiares, depois de inúmeras tentativas, conseguiram entrar em contato com eles para informar o ocorrido. Inicialmente o casal pensou se tratar de uma pegadinha ou brincadeira, mas, ao verificar o feed nas redes sociais, perceberam que aquilo realmente tinha acontecido.
Em seguida, eles, desesperadamente, apagaram as imagens e solicitaram à empresa de rede social que retirasse qualquer conteúdo de nudez referente a eles que eventualmente voltasse a ser publicado na rede. O constrangimento e o transtorno que isso provocou foi imenso. No trabalho, nos almoços de família e nas festas com os amigos, olhares de julgamento, palpites e comentários se tornaram rotina, o que os fazia reviver todo dia um torturante mal-estar.
Extremamente preocupados com a segurança desses e de outros dados, temendo outra violação de privacidade e intimidade, eles procuraram um especialista em hacking e solicitaram a ele que identificasse como fora obtido o acesso aos conteúdos vazados. Além disso, pediram a ele que, após identificar o problema, reparasse-o, assegurando a sua privacidade.
Passada uma semana da contratação do profissional, ele já havia identificado o problema: tratava-se de uma falha de segurança na provedora de Internet. Desse modo, o especialista, utilizando-se de termos técnicos de forma clara e objetiva, notificou a empresa provedora por meio de ação judicial sobre a necessidade de reparar aquela falha para evitar novas violações. O juiz, por sua vez, estabeleceu o prazo de um ano para a resolução da situação sob pena de multa diária.
Dois anos após o ocorrido, o casal teve mais uma vez os seus dados vazados, dessa vez foram alguns dados a respeito do cartão de crédito. Felizmente, a agência bancária agiu de maneira rápida e conseguiu realizar o bloqueio do cartão antes que algum prejuízo financeiro fosse gerado aos cônjuges. Revoltados por serem, mais uma vez, vítimas de ataques cibernéticos, os dois buscaram o hacking, que, novamente, após as devidas análises, constatou que a falha de segurança estava na provedora de Internet e que era especificamente a mesma que levara ao vazamento das fotos íntimas anos atrás.
Indignados com a inércia da empresa, eles buscam você, especialista em Direito Cibernético, para obter um parecer jurídico sobre a questão. Afinal, a empresa provedora é responsável civilmente pelos danos causados? Houve alguma responsabilidade que a empresa provedora deixou de cumprir? Se sim, qual?

Diante do caso exposto, é óbvia responsabilidade civil da empresa provedora. De acordo com a Lei nº 12.965/2014, ou simplesmente a Lei do Marco Civil da Internet, o provedor de conexão à Internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros. Ele somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente. Sendo assim, pode-se inferir que a empresa deixou de cumprir a responsabilidade legal de tomar ações no âmbito dos limites técnicos no prazo de um ano.

Bons estudos!

AVALIE ESTE MATERIAL

OBRIGADO PELO SEU FEEDBACK!