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FOCO NO MERCADO DE TRABALHO

DIREITOS POLÍTICOS

Laura Degaspare Monte Mascaro
Luiz Fernando Conde Bandini

Fonte: Shutterstock.

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Sem medo de errar

Para elaborar argumentos a serem apresentados na negociação com a liderança é preciso, primeiro, reconhecer quais os direitos políticos envolvidos no caso de uma manifestação.

Como vimos anteriormente, os direitos políticos reconhecidos pelo Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos de 1966 estão ligados aos direitos de liberdade de pensamento, de livre associação e de livre reunião para fins pacíficos, assim como de livre manifestação. Os direitos políticos não se resumem simplesmente ao direito de votar em representantes e ser votado para serem representantes de uma sociedade democrática, muito embora, em um Estado Democrático de Direito, essa condição seja essencial para a sua existência e manutenção.

Dessa maneira, reiteramos que é preciso reconhecer que o Estado não é o único âmbito onde a política pode ser exercida, e o voto não é o único direito político. Muitas vezes, o governo, os representantes eleitos, desvirtuam-se de seu eleitorado, ou falham em atender a uma minoria, que também precisa ser ouvida e possui direitos políticos, embora não consiga uma expressão considerável nas urnas, suficiente para eleger um representante. O representante do poder executivo passa a governar para todas as pessoas e não apenas para seu eleitorado e deve ouvir suas reivindicações. As vozes discordantes são o componente essencial de um Estado democrático. 

A liberdade política depende do agir conjunto e da manifestação coletiva, que dependem, por seu turno de um espaço público que sirva não apenas ao acesso individual aos recursos urbanos, mas também para o exercício da liberdade política na companhia de seus iguais. O mundo criado e compartilhado por todos tem uma dimensão espacial, é um lugar, que deve acolher também o exercício da liberdade política, não apenas as liberdades individuais, de locomoção, por exemplo. Na medida do possível, é necessário conciliar essas liberdades, negociando, desviando o percurso dos carros, por exemplo. Ao compreender a ação política ficará mais fácil entender o ponto de vista dos manifestantes e negociar com eles e evitar qualquer tumulto ou ação violenta. 

No caso dessa manifestação específica, no entanto, o direito político dos manifestantes esbarra no direito à saúde, que é um dos direitos que o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos escolhe privilegiar e proteger, quando este entra em conflito com direitos políticos. Em seus artigos 19, item 3 (b) e 21, o Pacto estabelece que o direito de expressão e de reunião pacífica serão restritos para proteger, dentre outras coisas, a saúde pública. 

Passemos, portanto, à negociação: um manual do Comitê Internacional da Cruz Vermelha sobre Direitos Humanos e Direito Internacional Humanitário para Forças Policiais e de Segurança indica que eventos de grande escala como protestos requerem preparação e cada vez mais as organizações responsáveis pela aplicação da lei, que é o caso da Tropa de Choque devem envolver-se nas fases preparatórias de forma a aumentar a previsibilidade da manifestação e diminuir conflitos. 

E quais são as vantagens desse envolvimento? 

  1. Os organizadores do protesto conhecerão os objetivos e os níveis de tolerância da operação da Tropa de Choque em relação à manifestação, bem como em relação a suas responsabilidades para com aqueles que não participam do evento, que envolve, neste caso, impedir que os manifestantes perturbem os doentes; 
  2. A Tropa de Choque fica familiarizada com os objetivos da manifestação e busca conhecer o número de participantes, provável comportamento, horários etc.
  3. As partes podem, assim, estabelecer procedimentos claros a respeito das rotas da manifestação, presença da força policial, planos de contingência etc.
  4. Os pontos de potencial conflito podem ser negociados e resolvidos antes do evento, de forma que não se transformem em um problema real no decorrer do protesto.

Outra questão interessante, apontada pelo Manual da Cruz Vermelha, é que embora as pessoas em uma multidão possam parecer uma massa e estejam agindo coordenadamente, elas permanecem indivíduos. Desse modo, além da negociação com a liderança é possível comunicar-se de maneira mais ampla com uso de equipamentos de amplificação sonoros, de forma a conduzir as pessoas da multidão. Assim, é possível também negociar esse ponto caso a liderança não esteja equipada para conduzir o fluxo de pessoas de forma a desviar do hospital. 

Outra questão apontada pelo manual é a da aparência ameaçadora que frequentemente assumem as forças policiais, como é o caso muitas vezes da Tropa de Choque. Por isso, em uma negociação, é importante colocar-se de forma mais acessível possível, tentando dissipar a imagem hostil. Assim coloca o manual:

As pessoas acham difícil de acreditar que o encarregado da aplicação da lei que veem, vestido em uniforme completo de choque, e com aspecto bem diferente da imagem que lhes é familiar, na verdade é o mesmo que conhecem. Não chega a ser uma surpresa que os encarregados, vestidos e equipados desta forma, tenham dificuldade de convencer o público de suas intenções pacíficas. 

CADERNO 7, [s.d], [s.p]

Desse modo, além de argumentar a respeito do reconhecimento da legitimidade da manifestação e dos limites impostos pela legislação de direitos humanos internacional, que já foi incorporada em nosso ordenamento por meio do Decreto Presidencial 592/1992 e, portanto, passa a fazer parte da legislação brasileira, é preciso que se levem em conta essas outras considerações de colocar ênfase no respeito aos direitos dos manifestantes e em uma ação preventiva, que é mais adequada para a garantia desses direitos.

Avançando na prática

O acesso ao direito de informação no Estado de Direito

Você trabalha em um departamento da Polícia Militar encarregado de responder aos pedidos de acesso à informação dirigidos ao órgão no Estado do Mato Grosso do Sul. Uma organização da sociedade civil que atua contra a “criminalização da pobreza” realizou um pedido, solicitando cópia dos Boletins de Ocorrência que indicam mortes por ação policial no Estado. Como você deve proceder?

É importante que você saiba que o direito à liberdade de expressão e de manifestação do pensamento, que é um direito civil e político, abrange também, como uma de suas modalidades, o direito à informação, que é um direito fundamental protegido pelo Art. 5o, XIV e XXXIII, e pelo artigo 220 da Constituição Federal. A Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) vem regular justamente a garantia de acesso à informação prevista no artigo 5o, XXXIII, que estabelece que “todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.” Nesse sentido, você deve disponibilizar os boletins solicitados nos termos e respeitando os procedimentos e prazos da Lei, sendo os boletins de ocorrência, neste caso, de interesse coletivo e não estando cobertos por qualquer sigilo em seu Estado.

Bons estudos!

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