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Sem medo de errar
Primeiramente, é preciso que você saiba que é muito comum que os cidadãos participantes dos CONSEGs demandem ações repressivas para a resolução de problemas e conflitos no espaço público, como prender, internar, proibir e expulsar. No entanto, o que não se percebe é que esses conflitos revelam que há outras demandas embutidas nessas questões, especialmente demandas de direitos humanos, como moradia, lazer, saúde e bem-estar, que são, segundo nossa Constituição, prerrogativas do Estado. É isso que você precisa mostrar aos seus colegas, porque com a questão do tráfico de drogas não é diferente.
Uma forma de mostrar a deficiência na garantia dos direitos humanos que está por trás de problemas sociais como esse é por meio de dados concretos, indicadores. Podemos observar, por exemplo, por meio do Sistema Intraurbano de Monitoramento dos Direitos Humanos, que a região do Campo Limpo possuía, em 2010, o indicador síntese da dimensão “violência” como insatisfatório (como não temos dados mais recentes, nos basearemos nos dados de 2010 para esse exercício).

Se observarmos, contudo, os demais indicadores síntese (criança e adolescente, mulher, negro, população idosa), percebemos que apenas a situação da população idosa é insatisfatória, sendo a situação das demais populações vulneráveis boa, relativamente à cidade de São Paulo em geral. Contudo, se observarmos os indicadores da situação socioeconômica que não compõem os indicadores síntese, percebemos que muitos deles indicam uma situação socioeconômica precária em relação ao restante da cidade. Mas como interpretar isso?

Apenas por meio dos indicadores quantitativos é difícil tirar alguma conclusão, mas pela observação do território percebemos que, provavelmente, a situação mostrada pelos indicadores socioeconômicos é devida à desigualdade existente da região, que reúne áreas extremamente ricas e extremamente pobres em um mesmo território. O abismo social é uma das grandes causas de violência e uma forma de atuar preventivamente seria diminuindo esse abismo. É isso que deve ser argumentado.
Mas, por meio de quais ações? Bem, em primeiro lugar, os indicadores nos mostram quais problemas sociais são mais pungentes nessa região, por exemplo, a questão da baixa escolaridade, a qual, provavelmente, impacta na renda per capita. Se considerarmos que grande parte dessa região é composta por lares de alta renda, podemos imaginar que a renda dos lares na favela de Paraisópolis, por exemplo, é ainda menor do que os indicadores mostram, tendo em vista que, para compor os dados, foram contabilizados todos os lares, e não apenas os lares da população mais pobre.
Outra importante fonte de informação seriam os próprios moradores da região, com enfoque para a população vulnerável. Para conhecer seus problemas e elaborar um projeto de segurança comum para todos é preciso ouvir a população. Como vimos, pode-se convocar a população da comunidade para audiências públicas, ouvir associações e conselhos comunitários em encontros individuais ou coletivos, promover pesquisas profissionais de opinião etc.
Caso se confirme que um dos problemas que repousa por trás da questão da violência na região seja a baixa escolaridade e a baixa renda, para além, é claro, da questão das condições de moradia, é preciso que se promova uma articulação intersetorial com as secretarias municipais, com a sociedade civil e com os demais entes federativos para potencializar o efeito das políticas públicas de educação, trabalho e habitação da região.
É preciso que você explique também que ações preventivas tendem a iniciar processos que produzirão resultados de médio e longo prazo, porém com efeitos mais duradouros. Além disso, isso não impede que haja ações de prevenção policial, como o patrulhamento de áreas com altos índices de criminalidade ou mesmo ações repressivas, mas essas ações devem ser realizadas a partir de diagnósticos inteligentes, com respeito aos direitos humanos e apenas quando necessário, sem que se excluam as ações de prevenção situacional e social.
Por fim, é preciso que você tente conscientizar seus colegas de conselho a respeito da importância de se romper com o paradigma repressivo tradicional e com a lógica do combate ao inimigo que foi herdada da ditadura, que não tem produzido resultados satisfatórios de longo prazo, e que iniciativas, como o policiamento comunitário, tentam superar, aproximando as forças de segurança pública da população e promovendo a cultura de paz.
Avançando na prática
O fomento da atividade policial
Você trabalha na Assistência Militar, da Prefeitura do Município de Teresina. O coordenador que acaba de assumir o órgão entende que a segurança pública é um assunto de polícia e que a melhor forma de desenvolver políticas públicas de segurança no âmbito municipal é fortalecendo a guarda civil metropolitana. Em uma reunião sobre a estratégia de segurança pública do município, na qual estarão presentes o coordenador e o prefeito, você terá a oportunidade de discutir a proposta do coordenador. O que você diria?
Em primeiro lugar, é preciso frisar que há muito mais que os municípios podem fazer na área da segurança que não envolve, necessariamente, guardas municipais. Reconhecer a responsabilidade das cidades na garantia da segurança pública significa aceitar a ideia de que a segurança não é apenas uma questão de polícia, que não são as únicas responsáveis pela ineficiência do Estado em combater a violência. Os municípios podem adotar práticas de segurança como política pública que extrapolam a lógica do confronto, adotando o caminho da prevenção. Embora os gestores políticos prefiram, muitas vezes, comprometer-se com práticas de maior impacto eleitoral, ações cujo impacto é facilmente mensurável, como compra de equipamentos ou aumento do efetivo das instituições de segurança stricto sensu, as políticas públicas que focam na prevenção são mais efetivas a longo prazo.