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Conceito de oralidade

Fabiana Claudia Viana Costa Dias

O que é oralidade? 

A oralidade é uma prática discursiva que se realiza pela fala.

Fonte: Shutterstock.

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convite ao estudo

Caro aluno, seja bem-vindo a esta unidade. Nela, você aprofundará seus conhecimentos acerca da oralidade e entenderá o que constitui essa prática social que, muitas vezes, é deixada à margem das práticas pedagógicas.

No contexto atual, a oralidade é bastante exigida. As aulas remotas em tempos de pandemia, a participação dos alunos por meio de vídeos, as lives com discussão de temas diversos e a formação complementar chegam a nós diariamente, e gêneros textuais orais, que antes eram restritos a certos contextos, hoje são gerados pelas novas mídias, fazendo parte do nosso dia a dia pelas mais variadas tecnologias digitais e de comunicação. Daí a importância de você estudar a oralidade, de aproveitar as tecnologias digitais de informação e comunicação como ferramentas para a sua formação e de você conhecer evidências científicas atuais advindas das diferentes áreas de conhecimento, as quais favorecem o processo de ensino e aprendizagem.

Nas seções desta unidade, você terá acesso ao conceito de oralidade enquanto prática social e também a seus aspectos fonéticos e fonológicos; refletirá sobre como ela é transposta para a escrita; e conhecerá os elementos que a constituem, como as repetições, as pausas e os truncamentos, os marcadores conversacionais e as entonações enfáticas.

Além desses itens, você também verá como a língua é socialmente construída e entenderá que tanto a oralidade quanto a leitura e a escrita são práticas sociais. Isso estará relacionado às situações comunicativas em que as práticas de oralidade acontecem, nos mais variados contextos.

Todo o conteúdo apresentado nesta unidade permitirá que você compreenda o papel da linguagem e da oralidade na comunicação humana, enquanto prática social, com suas especificidades culturais e linguísticas. Entenda como a BNCC concebe a oralidade e leve para a sua prática, tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental, propostas pedagógicas inclusivas que possibilitem diferentes expressões orais.

Bom estudo!

praticar para aprender

Caro aluno, a oralidade nos acompanha na maioria das nossas práticas linguageiras. Falar é a atividade de linguagem que mais exercemos, do momento em que acordamos até quando nos deitamos, isso é quase inquestionável. Na escola, não é diferente, pois as crianças falam o tempo todo de si, entre si e com o professor. Diante disso, como você pode usar essa prática para subsidiar a aprendizagem da oralidade na escola? O que é ensinar (e aprender) oralidade na escola, considerando que as crianças já falam? Essa questão, nada banal, é o ponto de partida para a elaboração de práticas pedagógicas que englobem as diferentes situações de comunicação em que a oralidade é o formato exigido.

Diante desses pressupostos, retomaremos o conceito de oralidade e insistiremos na importância de pensar essa prática para além de bate-papos, de práticas informais, sem planejamento. Para isso, a relevância de se pensar o uso da oralidade em práticas sociais será levantada nesta seção. Ao longo desta seção, reflita: em quais contextos a oralidade é exigida? 

Além de pensarmos na oralidade em contextos sociais, neste momento, você conhecerá alguns aspectos fonéticos e fonológicos que sustentam as práticas orais, os quais marcam, de uma determinada maneira, os modos como falamos, os diferentes “r”, “s” e outras particularidades das variedades (você se lembra das variedades linguísticas? Elas são um importante suporte para pensar fonética e fonologia).

Permeados por conhecimento sobre a oralidade, vamos entendendo como a transposição da oralidade para a escrita acontece e percebendo quais elementos da oralidade permanecem na escrita e de que modo a escola pode contribuir para que esses elementos deixem de estar na escrita. 

Foco na BNCC

A BNCC, para a área de Linguagens, no ensino fundamental, apresenta algumas habilidades que são previstas nas práticas de oralidade e, dentre elas, a habilidade de identificar gêneros do discurso oral, presentes em diferentes situações e contextos comunicativos, bem como suas características linguístico-expressivas e composicionais: conversação espontânea, entrevistas no rádio ou na TV, debate, noticiário de rádio e TV, narração de jogos esportivos, aula, debate e vários outros. Essa habilidade condiz com o que estamos propondo nesta seção, pois esses gêneros permitem mostrar que a oralidade é uma prática social com regras e particularidades que precisam ser ensinadas.

Vamos contextualizar a sua aprendizagem. Imagine que você leciona para uma turma de terceiro ano do ensino fundamental, em uma escola que se constitui, também, por turmas da educação infantil e dos anos finais do ensino fundamental. Essa informação é relevante, dada a continuidade da formação dos alunos no mesmo espaço escolar; se bem explorada, essa passagem de anos escolares pode acontecer permeada por diálogos entre professores e equipe gestora, sustentada pelo trabalho coletivo, com responsabilidades e contribuições compartilhadas.

Ainda nesse contexto, essa escola embasa seus trabalhos na elaboração e execução de projetos pedagógicos que priorizam os eixos de integração considerados na BNCC de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental: oralidade, leitura/escuta, produção escrita e multissemiótica e análise linguística/semiótica. Para nossa disciplina, a oralidade será a prioridade para a elaboração do projeto enquanto espaço de discussão e resolução de problemas.

Essa contextualização sustentará todas as situações-problema desta unidade. A escolha de projetos não foi selecionada de forma banal, mas considerando o que a BNCC (BRASIL, 2017, p. 30) discorre acerca de projetos pedagógicos, os quais, de modo geral, “devem ser adequados à realidade de cada sistema ou rede de ensino e a cada instituição escolar, considerando o contexto e as características dos seus alunos”. Isso é importante, inclusive, para a construção curricular, que precisa responder aos diferentes contextos e atender à comunidade.

Dadas essas condições, você, na posição de professor do terceiro ano do ensino fundamental, depara-se com uma situação em que as crianças não se sentem seguras para a apresentação de seminários. Qual projeto de trabalho você poderia propor para resolver esse problema? Embase a sua proposta nos autores que trabalhamos, nos conceitos apresentados e considerando a oralidade como objeto de ensino.

Aproveite esta seção para aprofundar seus conhecimentos sobre a oralidade, enquanto objeto de conhecimento, e compreender como as práticas de linguagem orais funcionam nos espaços sociais e escolares. Construa o seu planejamento profissional a partir de diferentes recursos, utilize a tecnologia de informação e comunicação a seu favor e aprimore sua formação. Bom estudo!

conceito-chave

ORALIDADE

Caro aluno, nesta seção, você conhecerá o que pesquisadores sobre linguagem, sobretudo da linguagem oral, dizem sobre a oralidade e, assim, você refletirá sobre os usos sociais da linguagem oral nas diferentes manifestações discursivas.

A oralidade é um dos eixos de integração da BNCC, na área de Linguagens, no componente curricular Língua Portuguesa, ao lado da leitura/escuta, produção e análise linguística e semiótica. Por constituir um desses eixos, ela deverá fazer parte de todo o seu trabalho no ensino fundamental. Percebe o quão importante é estudar sobre a oralidade? Daí a importância desta disciplina e dos conteúdos que trataremos nesta unidade e, agora, nesta seção.

Nesta disciplina, você conheceu os estudos de Marcuschi (2001), um pesquisador da oralidade e de práticas na sala de aula. Vamos retomá-lo aqui, a fim de reforçar o que é oralidade, quais são seus elementos e usos em práticas sociais e discursivas. Para o autor, no livro Da fala para a escrita: atividades de retextualização, a oralidade é uma prática social interativa que se apresenta sob os vários gêneros textuais que se dão na realidade sonora, e ele diz que há uma realização que vai da mais informal para a mais formal, nos variados contextos de uso. 

É importante entendermos que a oralidade não é o espaço somente da informalidade, como muitos pensam, pois há práticas sociais orais que exigem uma formalidade. A aula é um bom exemplo para ilustrar a formalidade, assim como uma palestra e alguns debates jornalísticos. Em contrapartida, bate-papos, algumas entrevistas de programas de auditório e alguns vídeos de youtubers (que também podem ser espaços de formalidade) são exemplos de atividades orais informais.

Pensar essas e outras diversas manifestações orais nos permite recorrer a Elias (2014, p, 34) para dizer que “estudar o texto oral de maneira contextualizada, observando sua organização e complexidade leva o aluno a ter consciência dos traços da oralidade”. Você percebe como a questão da oralidade vai além da oposição oralidade e escrita? É muito simples pensar que a oralidade é diferente da escrita, mas isso é insuficiente para discutir oralidade enquanto prática social. 

ORALIDADE ENQUANTO PRÁTICA SOCIAL

Como a escola lida com a oralidade? Há atividades de oralidade no espaço escolar? Você já deve ter reparado o quanto a oralidade está presente em sala de aula, considerando que as crianças falam – e muito –, mas pouco em atividades sistemáticas nas propostas pedagógicas. É aí que o seu planejamento precisa estar bem engajado, colocando a oralidade no lugar de objeto didático a ser apreendido, acessando os diferentes modos de falar que as práticas sociais exigem.

A linguagem oral, enquanto prática social, permite que a escola e você, enquanto professor na educação infantil e no ensino fundamental, provoquem na criança o olhar para “como” a oralidade é desenvolvida:

  • Onde podemos falar?
  • De que modo podemos falar?
  • Com quem podemos interagir na oralidade?
  • Quais recursos podem ser explorados nas manifestações orais?
  • Quais variedades são aceitas na fala?

Entenda que essas questões podem levar a reflexões mais pertinentes sobre a linguagem, as quais ultrapassam a limitada questão de oposição entre oralidade e escrita. Trabalhar com essas indagações na escola é levar o aluno a pensar sobre como as produções orais acontecem no social, em que medida falamos da maneira como falamos e que isso não é fruto apenas da nossa vontade.

A criança, o jovem ou o adulto já sabe falar com propriedade e eficiência comunicativa sua língua materna quando entra na escola, e sua fala influencia a escrita, sobretudo no período inicial da alfabetização, já que a fala tem modos próprios de organizar, desenvolver e manter as atividades discursivas. Esse aspecto é importante e permite entender um pouco mais as relações sistemáticas entre oralidade e escrita e suas inegáveis influências mútuas. (MARCUSCHI; DIONISIO, 2007, p. 15)

Autor da citação

Se as crianças aprendem a escrever escrevendo, elas aprendem a falar falando. As práticas de oralidade na escola permitem o aprimoramento dessa modalidade linguística, assim como permitem que os alunos entendam que há elementos que sustentam as práticas de linguagem também na oralidade, que a fala serve à oralidade e que há regras que direcionam a nossa produção oral. Assim, você pode retomar as discussões que travamos sobre as variedades linguísticas, pensando em mostrar para os seus alunos que, na oralidade (e na escrita), precisamos adequar a nossa fala ao contexto comunicativo que colocará a linguagem em prática.

Reflita
  1. Focalizemos nas práticas de linguagem oral que acontecem no social: quais situações você percebe que a fala é privilégio de alguns em detrimento de outros? Como a escola pode contribuir para estreitar esse abismo de desigualdade de dizeres?
  2. Quando você se depara com o ensino e a aprendizagem da oralidade na escola, quais são as referências que você encontra dessa prática em livros didáticos e apostilas? Há o ensino sistemático e planejado da oralidade?

Estudar a oralidade nos permite entender o funcionamento da escrita, pois compreendemos que esta pode transformar a fala e vice-versa. Falamos bem mais do que escrevemos, apesar de a escola valorizar a escrita em detrimento da fala. A escrita é o lugar legitimado da linguagem, é onde podem ser comprovadas as atividades linguageiras, aquilo que é “palpável”, comprovável, é a “prova” do que foi feito. Essas afirmações podem ser algumas das justificativas da supervalorização da escrita na escola.

Assimile

A oralidade é diferente da escrita, isso é sabido por todos nós. A questão que se faz importante é pensar que estudar oralidade é estudar a linguagem oral nas mais variadas situações de comunicação, das mais informais e cotidianas até as mais formais e restritas a ambientes e eventos demarcados.

FONÉTICA E FONOLOGIA

Agora, abordaremos uma questão bastante importante para discutir a oralidade: a pronúncia das palavras que falamos. Você já deve ter atentado às diferentes pronúncias que encontramos para uma mesma palavra. É na oralidade que as marcações fonéticas da língua são perceptíveis. Dito de forma bem simplista, a fonética é uma ciência que estuda os sons de uma língua, a produção da fala e tudo o que a envolve, desde as articulações, ou seja, o que (e como) articulamos para que os sons sejam produzidos da maneira como são: os lábios, os dentes, o palato, etc.

A BNCC (BRASIL, 2017), para discorrer acerca dos processos de alfabetização no espaço de “Práticas de linguagem, objetos de conhecimento e habilidades” em Língua Portuguesa, no ensino fundamental, nos mostra as relações fono-ortográficas do português, evidenciando que há bem pouca regularidade de representação entre fonemas e grafemas. Isso faz com que você reflita sobre a transposição da oralidade na escrita e perceba como a criança se depara com a relação letra e som na fase de aquisição da linguagem.

Pesquise mais 

Para você conhecer mais sobre fonética e fonologia, o texto de Magnun Madruga pode ser um bom suporte. Entenda a diferença entre fonética e fonologia lendo a sequência de páginas 23 a 35. Boa leitura!

  • MADRUGA, M. R. Fonética e fonologia da língua portuguesa. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2018. 176p.

No português do Brasil, em apenas alguns poucos casos, há uma letra para um som. Na maioria das vezes, há várias letras para representar um único som.

Quadro 2.1 | Relações fono-ortográficas do português do Brasil
SONS E SUAS REPRESENTAÇÕES NA ESCRITA
Sons Representações
som de /s/ Pode ser representado na escrita por s, c, ç, x, ss, sc, z ou xc.
som de /j/ Pode ser representado na escrita por g ou j.
som de /z/ Pode ser representado na escrita por x, s ou z.
LETRAS QUE REPRESENTAM VÁRIOS SONS
Letras 
Sons
Letra s Pode ter som de /s/ ou /z/.
Letra z Pode ter som de /s/ ou /z/.
Letra x Pode ter som de /s/, /z/, /∫/ ou /ks/.
RELAÇÃO REGULAR DIRETA ENTRE FONEMA E GRAFEMA
Grafemas
Fonemas
p, b Bilabiais: articulamos lábio inferior e lábio superior para produzirmos os sons. Exemplos: pipa, boca.
  • Surdas: quando não há vibração das cordas vocais, também chamadas de desvozeadas, como o fonema /p/.
  • Sonoras: quando há a vibração das cordas vocais, também chamadas de vozeadas, como o fonema /b/.
t, d Linguodentais: articulamos língua e dentes para produzirmos os sons. Exemplos: data, Tatá.
  • Surdas: /t/.
  • Sonoras: /d/.
c Labiodentais: articulamos lábio inferior e dentes superiores. Exemplo: faca, vaca.
Fonte: adaptado de BNCC (BRASIL, 2017, p. 91-92).

A BNCC apresenta, ainda, letra que não representa som algum, como a letra -h. Esses são apenas alguns exemplos da relação fonética da língua. 

Essas descrições apresentadas nos permitem refletir sobre as marcas da oralidade na escrita, em que o modo de falar afeta diretamente a escrita da criança, como se, para ela, a escrita representasse a fala de forma exata. Outro ponto que podemos observar em algumas situações é a troca de p por b, tanto na fala quanto na escrita; é só lembrarmos que ambos requerem o mesmo ponto de articulação: lábios inferiores e superiores. Percebe o quanto são “justificáveis” as trocas na escrita quando a criança ainda não tem “consciência fonológica”?

Vale lembrar que a consciência fonológica é a apropriação, pela criança, dos fonemas do português e de sua organização em segmentos sonoros maiores, como sílabas e palavras, bem como o conhecimento do alfabeto em seus vários formatos (letras de imprensa e cursiva, maiúsculas e minúsculas), além do estabelecimento de relações grafofônicas entre esses dois sistemas de materialização da língua (BRASIL, 2017).

Pesquise mais 

Se você se interessar por essa questão, leia os textos escritos pela pesquisadora Thaís Cristófaro Silva, como o livro Fonética e fonologia do português: roteiro de estudos e guia de exercícios (SILVA, 2013); além deste livro, a autora, junto a outra pesquisadora, Hani Camille Yehia, mantém um site, Fonologia, em que apresenta conceitos, imagens, sons e articulações que valem a pena serem vistos, pois ali você tem o funcionamento (também por vídeos) das articulações no momento da produção dos fonemas, todas as descrições de todos os fonemas, com exemplificações e exercícios. Vale a leitura! 

ORALIDADE E ESCRITA NA ESCOLA

Marcuschi e Dionísio (2007) nos ajudam a entender a transposição oral para a escrita e dizem que as línguas se desenvolvem primeiro na forma oral, que é o modo pelo qual os falantes a conhecem, e somente depois a escrita se desenvolve, mas esta não representa a fala nem é dela derivada de maneira direta.

As marcas da oralidade na escrita, resultantes da transposição, são um efeito da não familiaridade do aluno com a escrita. Nessa fase, a criança entende que a escrita representa a fala e é traçada tal qual é falada. Aqui, é importante você perceber que a transposição do que falamos não é uma “transcrição” da oralidade para a escrita, mas são escritas que se dão independentemente da fala, em situações outras; tampouco é o que Marcuschi (2001) chama de retextualização, isto é, a passagem do texto oral para o escrito, por exemplo uma entrevista realizada oralmente e transcrita para uma revista ou uma aula proferida oralmente e publicada de forma escrita em uma revista científica.

Entenda que não há características linguísticas que sejam exclusivas da oralidade ou da escrita (relembre o exemplo do “p” e “b” apresentados anteriormente, no caso da fonética, ou construções de frases que sejam permitidas apenas na oralidade ou na escrita); as duas modalidades têm semelhanças e diferenças, mas sem regras exclusivas. Marcuschi (2007) menciona as chamadas marcas de oralidade, as quais que aparecem na escrita informal, como os bate-papos de internet. Percebe como é tênue a linha que separa as marcas linguísticas da oralidade e da escrita?

Assim, podemos dizer que as diferenças são da ordem do funcionamento, e não da ordem do sistema. É totalmente irrelevante para a definição de fala o fato de haver reduções morfológicas do tipo ‘pra, pro, prum’, pois esses são fenômenos comuns também na escrita. Basta entrar num bate-papo na internet ou ler bilhetes e cartas pessoais. (MARCUSCHI, 2007, p. 70)

Autor da citação

O autor traz, ainda, uma questão que é bastante importante para você pensar a relação oralidade e escrita: os textos híbridos, aqueles que nascem originalmente em uma modalidade e “migram” para outra, como as notícias em rádios e telejornais, que são escritas oralizadas, ou as entrevistas impressas, que nascem da oralidade. 

Assim, concluímos que as realizações da linguagem, seja oral ou escrita, não são meramente classificadas em quadros com características predeterminadas; ensinar a linguagem oral na escola requer mais do que regras e aplicações, mas reflexões sobre o funcionamento dessas modalidades e sua circulação pelas práticas sociais.

Ainda seguindo nas reflexões de Marcuschi (2007), já é sabido por nós que, em nosso cotidiano, falamos muito, a maior parte do tempo, e escrevemos bem pouco. Daí, entendemos que a oralidade é de extrema importância, mesmo em tempos em que a escrita tem maior valor linguístico. O autor diz, ainda, que a oralidade jamais desaparecerá e, enquanto prática social, é inerente ao ser humano e não será substituída por nenhuma outra tecnologia: “Ela será sempre a porta de nossa iniciação à racionalidade e fator de identidade social, regional, grupal de indivíduos” (MARCUSCHI, 2007, p. 36).

Todas essas reflexões, as quais evidenciam a importância da oralidade, servem como subsídios para você pensar na relevância do ensino de oralidade na escola, para se certificar de que ela se ensina. Podemos considerar a oralidade pelos mais variados lugares de reflexão. Vamos exemplificar um deles: a argumentação, que é uma competência básica que perpassa toda a educação básica, em todas as áreas do conhecimento, conforme nos traz a BNCC. A oralidade é uma prática em que a argumentação pode – e deve – ser desenvolvida, sobretudo se levarmos em conta que as crianças falam, e muito, sobre diversos assuntos quase o tempo todo; assim, por que não explorarmos essa prática e trabalharmos a argumentação? Quer seja para explicitar aos colegas as razões da avaliação positiva de um livro, para apresentar as regras de um jogo e explicar o seu funcionamento ou para reforçar o ponto de vista diante de uma discussão.

Pensar as atividades de oralidade como práticas que se bastam por si dá à oralidade o lugar de destaque que ela merece, sem precisar se pautar em atividades que buscam a escrita como resultado, o que é fundamental para o planejamento escolar. Santos (2004) afirma que, ao mesmo tempo em que se peca por a escrita pretender ser um registro regular, natural e inequívoco da fala, também se peca por priorizarmos a primeira em detrimento da segunda como lugar legitimado de saber.

As diversas linguagens que circulam na atualidade – verbal, corporal, visual, sonora e digital – permitem que os alunos se expressem de várias formas e partilhem informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos. Aí entra o papel da escola: oferecer uma gama de atividades que possibilitem ao aluno desenvolver o domínio da expressão oral e escrita para seu uso efetivo nas diferentes situações de uso público da linguagem, além de fazer a curadoria do que é válido no meio digital como informação para a construção do conhecimento.

Você deve ter em mente que ensinar a oralidade na escola requer planejamento para que os alunos tenham contato com textos orais mais formais que circulam no social e que possam ser classificados como objeto didático.

Como objeto didático, a oralidade pode desenvolver habilidades, tal qual nos coloca a BNCC, pois permite ao aluno expor trabalhos ou pesquisas escolares, por meio de seminários, com apoio de recursos multissemióticos, orientando-se por roteiro escrito, planejando o tempo de fala e adequando a linguagem à situação comunicativa. Um seminário em sala de aula bem planejado faz que o aluno escute, com atenção, as apresentações realizadas por colegas, formule perguntas e solicite esclarecimentos sempre que necessário. Perceba quantas habilidades podem ser desenvolvidas por essa atividade bastante presente na escola.

Por dentro da BNCC

A BNCC propõe a leitura, escuta e produção de textos orais, escritos e multissemióticos em circulação dos diferentes meios. Esse documento discute a importância do acesso a textos orais como subsídio para a aquisição da linguagem escrita. Para isso, apresenta várias habilidades que sustentam as práticas de oralidade na escola. Daí a importância de “refletir sobre diferentes contextos e situações sociais em que se produzem textos orais e sobre as diferenças em termos formais, estilísticos e linguísticos que esses contextos determinam, incluindo-se aí a multimodalidade e a multissemiose” (BRASIL, 2017, p. 79).

Essas determinações sustentam as discussões propostas nesta seção, sobretudo quando pensamos sobre as práticas sociais de oralidade, o ensino da oralidade na escola, com todas as determinações trazidas para sustentar a elaboração de propostas pedagógicas.

O seminário, enquanto gênero textual da oralidade, apesar de pautado em pesquisas e na escrita, permite o desenvolvimento oral dos alunos nas diferentes etapas da educação básica, uma habilidade bastante requisitada no mundo contemporâneo. Dolz e Scheuwly (2004) falam do seminário como um procedimento metodológico importante para que técnicas de estudo, pesquisa e reflexão sobre os mais variados assuntos, em grupo ou individualmente, sejam desenvolvidas em sala de aula.

Essa atividade prepara para outras atividades exigidas nas práticas sociais, para além da escola; trabalha o planejamento da oralidade, o ajuste de variedades linguísticas, a postura de fala e permite correções que são distintas do texto escrito. Hoffnagel (2007) acrescenta que a correção é uma estratégia de formulação textual. O falante pode mudar de ideia sobre o que está dizendo, confundir-se na pronúncia de uma palavra, usar uma ou outra concordância verbal ou nominal inadequada e recorrer à correção para aprimorar o seu texto oral.

Esperamos que você tenha observado que trabalhar a oralidade em sala de aula de maneira planejada e engajada contribui para que os alunos exercitem a curiosidade intelectual, utilizem as tecnologias digitais, as diferentes linguagens e construam argumentos para defender seus pontos de vista, posicionando-se de forma ética. Vamos repensar a oralidade na sala de aula?

Exemplificando
  1. Você já deve ter se deparado com situações em que as atividades de oralidade na escola são consideradas desorganizadas, informais e que não constituem práticas pedagógicas e, muito menos, textos. Os autores aqui apresentados são bastante enfáticos em defender a oralidade como produção textual, que evidencia uma identidade e permite o exercício da argumentação.
  2. No português do Brasil, alguns sons são representados, na escrita, por diferentes grafemas, e isso pode gerar alguma confusão em crianças em fase de aquisição da linguagem escrita. É bastante comum, nos anos iniciais, nós nos depararmos com escritas do tipo: telia, masa, caza, etc. O uso de diferentes gêneros textuais na escola ou a discussão entre pares para se refletir sobre a escrita podem ser exemplos para sanar esses registros.
  3. A escola, muitas vezes, reproduz atividades de oralização da escrita. Lembre-se da diferença entre atividades de oralidade e atividades de oralização da escrita.

Nesta seção, pudemos retomar conceitos de oralidade sem colocá-la em oposição à escrita, e entender que a transposição da oralidade para a escrita constitui o processo de aquisição da linguagem escrita e, algumas vezes, tem relação com a fonética e a fonologia que sustentam a língua que falamos. Essas discussões são importantes para pensarmos o planejamento das atividades pedagógicas sobre oralidade e para conhecermos os elementos constituintes da oralidade. 

Faça valer a pena

Questão 1

Leia a afirmação de Magda Soares:

A natureza do processo de alfabetização de crianças das classes favorecidas, que convivem com falantes de um dialeto oral mais próximo da língua escrita (a chamada ‘norma padrão culta’) e que têm oportunidade de contato com material escrito (por intermédio, por exemplo, de leituras que lhes são feitas por adultos), é muito diferente da natureza do processo de alfabetização de crianças das classes populares, que dominam um dialeto geral distante da língua escrita e têm pouco ou nenhum acesso a material escrito.

(SOARES, 2008, p. 20)

Assinale a alternativa que apresenta corretamente considerações sobre a relação oralidade/escrita:

A criança precisa dar conta de que há regras na oralidade que precisam ser seguidas, e que os textos orais não são livres, desprovidos de convenções que sustentam o modo como eles são circulados: onde, quando, como e para quem. Assim, não dá para considerarmos a oralidade como o lugar no informal e, tampouco, que a argumentação só se dá na escrita.

Correto!

Você deve ter se lembrado de todas as discussões propostas sobre a contextualização dos gêneros textuais orais, quando ensinados na escola.

A alternativa está incorreta porque coloca oralidade e escrita como práticas opostas, com características distintas. Isso deve ter remetido você à retextualização que Marcuschi cita, quando temos textos originados na oralidade (ou na escrita) e que migram para outra modalidade.

O modo como a criança fala afeta diretamente o modo como ela escreve, e cabe à escola pensar em práticas que vão, pouco a pouco, eliminando essas marcas da oralidade que insistem em aparecer na escrita das crianças.

A criança precisa dar conta de que há regras na oralidade que precisam ser seguidas, e que os textos orais não são livres, desprovidos de convenções que sustentam o modo como eles são circulados: onde, quando, como e para quem. Assim, não dá para considerarmos a oralidade como o lugar no informal e, tampouco, que a argumentação só se dá na escrita.

Questão 2

Para a BNCC,

No Ensino Fundamental – Anos Iniciais, aprofundam-se as experiências com a língua oral e escrita já iniciadas na família e na Educação Infantil.
Assim, no Ensino Fundamental – Anos Iniciais, no eixo Oralidade, aprofundam-se o conhecimento e o uso da língua oral, as características de interações discursivas e as estratégias de fala e escuta em intercâmbios orais. 

(BRASIL, 2017, p. 89)

Considerando a compreensão e produção de textos orais, avalie as afirmativas a seguir:

  1. As tradições orais precisam ser conhecidas na escola, bem como serem objetos de reflexões sobre os sentidos que geram e a sua circulação no social.
  2. Trabalhar a oralidade em sala de aula pressupõe, também, ensinar uma escuta ativa, que considere o contexto de produção dos textos.
  3. Produzir textos orais na escola deve considerar as situações de comunicação em que aparecem textos informais, característica inerente aos textos orais.
  4. As atividades com textos orais devem prever a análise de estratégias discursivas e de recursos linguísticos utilizados nas produções orais.

A partir do exposto, assinale a alternativa correta:

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Correto!

Você acertou! A afirmativa III – errada – apresenta uma colocação que contrapõe o que discutimos nesta seção: a oralidade ser constituída apenas por textos informais. Ao longo desta seção, constatamos que a oralidade, assim como a escrita, tem em seu funcionamento gêneros textuais que clamam por formalidade linguística e gêneros que permitem uma variedade linguística que se pauta na informalidade.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Questão 3

Partindo-se do princípio que são os usos que fundam a língua e não o contrário, defende-se a tese de que falar ou escrever bem não é ser capaz de adequar-se às regras da língua, mas é usar adequadamente a língua para produzir um efeito de sentido pretendido numa dada situação. Portanto, é a intenção comunicativa que funda o uso da língua e não a morfologia ou a gramática. Não se trata de saber como se chega a um texto ideal pelo emprego de formas, mas como se chega a um discursivo significativo pelo uso adequado às práticas e à situação a que se destina. 

(MARCUSCHI, 2010, p. 9)

Com base nas colocações de Marcuschi sobre o uso da língua no processo de aprendizado, avalie as seguintes asserções e a relação proposta entre elas:

I. No que tange ao ensino da oralidade, os diversos gêneros orais precisam ser apresentados aos alunos na escola, colocando-os mais próximo das práticas sociais, levando em conta as intenções comunicativas.

PORQUE

II. O efetivo conhecimento da língua só acontece a partir de seus usos, nas diferentes situações de comunicação que se dão em espaços sociais, e é a escola o lugar de aprendizagem dos mais variados gêneros da oralidade.

A respeito dessas asserções, assinale a alternativa correta:

Correto!

Dessa forma, a asserção I, que trata do uso dos gêneros interligados às práticas sociais, é verdadeira e se sustenta no cuidado com as intenções comunicativas. Se assim consideramos, o fato de os diferentes usos da linguagem (asserção II) dadas as diferentes situações de comunicação se justificam.

Para responder a esta questão, você precisa, além de se sustentar nas discussões realizadas durante esta seção, se apoiar no texto-base do pesquisador Marcuschi (2010). Verifique que, para ele, os usos de linguagem são determinantes para que o aprendizado se dê, saber usar a língua nas diversas situações de comunicação, produzindo discursos coerentes com o contexto. E de que maneira você acha que isso é possível de ser praticado na escola? Por meio dos diferentes gêneros orais que precisam circular nesse espaço.

Para responder a esta questão, você precisa, além de se sustentar nas discussões realizadas durante esta seção, se apoiar no texto-base do pesquisador Marcuschi (2010). Verifique que, para ele, os usos de linguagem são determinantes para que o aprendizado se dê, saber usar a língua nas diversas situações de comunicação, produzindo discursos coerentes com o contexto. E de que maneira você acha que isso é possível de ser praticado na escola? Por meio dos diferentes gêneros orais que precisam circular nesse espaço.

Para responder a esta questão, você precisa, além de se sustentar nas discussões realizadas durante esta seção, se apoiar no texto-base do pesquisador Marcuschi (2010). Verifique que, para ele, os usos de linguagem são determinantes para que o aprendizado se dê, saber usar a língua nas diversas situações de comunicação, produzindo discursos coerentes com o contexto. E de que maneira você acha que isso é possível de ser praticado na escola? Por meio dos diferentes gêneros orais que precisam circular nesse espaço.

Para responder a esta questão, você precisa, além de se sustentar nas discussões realizadas durante esta seção, se apoiar no texto-base do pesquisador Marcuschi (2010). Verifique que, para ele, os usos de linguagem são determinantes para que o aprendizado se dê, saber usar a língua nas diversas situações de comunicação, produzindo discursos coerentes com o contexto. E de que maneira você acha que isso é possível de ser praticado na escola? Por meio dos diferentes gêneros orais que precisam circular nesse espaço.

referências

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, DF: MEC. 2017. Disponível em: https://bit.ly/2LsYtUp. Acesso em: 24 abr. 2020.

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