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NÃO PODE FALTAR

Elementos constituintes da oralidade

Fabiana Claudia Viana Costa Dias

Práticas orais de uso da linguagem

A BNCC prevê práticas orais de uso da linguagem que envolvem tanto a compreensão da escuta quanto a produção da fala, negociando os significados entre os interlocutores, com ou sem contato face a face.

Fonte: Shutterstock.

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praticar para aprender

Caro aluno, nesta seção conheceremos um funcionamento da linguagem oral que, para alguns, é considerado “técnico”: os elementos constituintes da oralidade. Os elementos que trataremos aqui são as repetições, as pausas, os truncamentos, os operadores conversacionais e as entonações enfáticas.

Você verá que eles não são meras marcas de oralidade, ao contrário, são constituintes da oralidade e afetam a produção dos sentidos do texto oral. As repetições, por exemplo, podem ser um recurso utilizado para reforçar um dizer que se quer destacar ou para retomar o que foi dito pelo interlocutor; as pausas que damos durante a fala, que não acontecem da mesma maneira para todos (isso pode ser observado por um simples exercício: se todos os alunos lerem um mesmo texto, sem pontuação, por exemplo, darão pausas em lugares distintos, e isso diz muito em relação aos sentidos); os marcadores conversacionais, que são recursos que nos auxiliam na produção oral, seja para nos manter no turno da conversa – “acho que”, “veja bem”, “então” – ou para passar o turno para o outro – “né?”, “não é?”, “entendeu?”; e as entonações enfáticas, as quais nos mostram o quanto o tom que usamos para falar determinadas palavras ou frases é determinante do sentido daquilo que falamos.

Agora, vamos conhecer o funcionamento desses constituintes? 

Vamos contextualizar a sua aprendizagem. Imagine que você é professor em uma escola que atende a Educação Básica: educação infantil e ensino fundamental. Nela, você é responsável por uma turma de quarto ano, bastante heterogênea, com alunos que estudam nesta instituição desde os primeiros anos escolares. Ter alunos que já eram acompanhados por outros professores da escola, que você tenha conhecimento da trajetória educacional e conheça um pouco da história de vida, ajuda bastante para a elaboração de práticas pedagógicas contextualizadas.

Diante desse contexto, está sendo planejado um evento artístico-literário na escola, e você ficou responsável por elaborar uma atividade para ser apresentada neste evento com sua turma de quarto ano. Você é livre para criar uma atividade em que os alunos façam uma participação oral. Toda a escola participará, além de famílias, comunidade e até mesmo algumas autoridades locais. Utilize de todo o conhecimento que você construiu até aqui nesta disciplina, as discussões acerca das variedades linguísticas, o uso de gêneros textuais contextualizados e explore os elementos constituintes da oralidade: a repetição, as pausas e os truncamentos, os operadores conversacionais e as entonações enfáticas.

Para esta atividade, elabore uma proposta pedagógica que contenha:

  • Tema.
  • Descrição.
  • Objetivos.
  • Competências e habilidades.
  • Gênero textual utilizado.
  • Recursos utilizados.
  • Breve descrição da etapa do trabalho.

Sabemos que, apesar de planejarmos a atividade, o andamento também direciona suas etapas.

Vamos elaborar? Este é o momento para você conhecer os estudos científicos advindos da área da oralidade, sobretudo dos elementos constituintes, o que favorecerá o seu processo de aprendizagem. Aproprie-se desses novos conhecimentos para aperfeiçoar o seu exercício profissional.

Bons estudos! 

conceito-chave

Com toda razão, a oralidade exige o reconhecimento de seus direitos, pois começamos a descobrir mais nitidamente o papel fundador do oral na relação com o outro. O desejo de falar vem à criança pela música das vozes, que a envolve, nomeia e chama a existir por sua conta. Toda uma arqueologia de vozes codifica e torna possível a interpretação das relações, a partir do reconhecimento das vozes familiares, tão próximas. Músicas de sons e de sentidos, polifonias de locutores que se buscam, se ouvem, se interrompem, se entrecruzam e se respondem. (CERTEAU; GIARD, 2013, p. 336)

A escolha da epígrafe que abre esta seção, escrita por Michel de Certeau e Luce Giard, pretende provocar em você um olhar para a importância da oralidade, enquanto um direito, e para o desejo da fala pelas crianças, que pode ser materialmente verificado na escola pela “tagarelice” delas, que interagem entre si, por meio das palavras, como um arranjo musical. 

Conforme já apresentamos, nesta seção, você conhecerá os elementos constituintes da oralidade, essa prática social cotidiana que nos acompanha desde o despertar do dia até quando vamos nos deitar. Muitos autores que sustentam nossas discussões até aqui seguem nos acompanhando nesta etapa, para que você entenda, por meio desses estudiosos da oralidade, alguns desses elementos que se alocam na nossa prática da linguagem oral, as repetições que fazemos quando falamos, as pausas e os truncamentos que constituem toda manifestação oral, os marcadores conversacionais que sustentam a nossa fala e as entonações enfáticas que colocamos nas palavras para produzirmos os mais variados sentidos. Vamos conhecer um pouco desse funcionamento?

Você já reparou como é diferente o modo como as pessoas falam (e escrevem)? Já percebeu que cada um tem um estilo de elaboração para seus textos? Já observou que algumas palavras ou frases, às vezes, são recorrentes na fala de uma pessoa? Você já se pegou “copiando” o estilo de fala de alguém? Isso é linguagem em prática social, na presença cotidiana de estar no mundo. Essa é apenas uma introdução para apresentarmos os elementos que constituem a oralidade e para você se familiarizar com o funcionamento da linguagem, que, aparentemente, acontece pela escolha de quem fala.

REPETIÇÃO

Vamos começar pelo elemento chamado “repetição”. A repetição é um recurso que utilizamos na fala, o qual é resultante de vários fatores, desde um domínio ainda imaturo dos elementos linguísticos (“então, a professora falou pra ele sentar e ele falou para a professora que não ia sentar; daí a professora chamou a diretora”), até a elaboração sofisticada da linguagem, que marca a ênfase que queremos dar a determinado item (“ele me entregou na saída o texto na saída, na saída”), ou mesmo para chamar a atenção do interlocutor (“você entendeu agora? Entendeu?”).

Perceba que a repetição, ou qualquer outro elemento constitutivo da oralidade, não é de simples análise, ou seja, um recurso resultante de uma falha no uso da língua ou sofisticado apenas. Precisamos, enquanto professores, analisar como essas ocorrências aparecem nos textos orais em cada contexto, pois somente assim teremos uma análise reflexiva sobre a repetição.

A pesquisadora de oralidade da Universidade Federal Fluminense, Lúcia Teixeira, diz que:

[...] a transcrição de uma conversa livre pode oferecer a oportunidade de observar a hesitação, a reformulação e a repetição como procedimentos-padrão, perfeitamente comuns e aceitáveis nessa situação típica da esfera de comunicação cotidiana, em que predomina o registro informal da língua, mas embaraçosos numa situação de formalidade, em que as conversas devem ocorrer num registro cuidado e com temática voltada para assuntos de interesse mais geral e diversificado. (TEIXEIRA, 2012, p. 243)

Autor da citação

Essa colocação da autora nos faz perceber que a adequação da linguagem é necessária também na oralidade e que, se analisarmos minuciosamente determinado texto oral, perceberemos que as hesitações e a repetição – elemento que estamos dando destaque nesta parte da seção – fazem parte da produção oral em contextos cotidianos, de informalidade.

Outro pesquisador que concorda com a ideia de que a repetição está na maioria das práticas de oralidade é Marcuschi (2006, p. 219), o qual afirma que a repetição serve para “contribuir para a organização discursiva e para a monitoração da coerência textual, favorecer a coesão e a geração de sequências mais compreensíveis, dar continuidade à organização tópica e auxiliar nas atividades interativas”.

Koch (2005) acrescenta que a repetição está presente no discurso conversacional, e os parceiros, durante a construção do texto, criam, preservam e negociam as identidades, e o texto reflete essa atividade conjunta de produção. Isso permite refletir sobre as repetições que acontecem na nossa fala e na troca de turnos, quando repetimos o que o outro diz para darmos encadeamento na conversa.

E qual seria a definição de repetição? Para Silva (2001), a repetição é o retorno de elementos linguísticos após a sua primeira ocorrência em um texto; para Marcuschi (2006, p. 220), a “repetição é produzir o mesmo segmento linguístico duas ou mais vezes. Contudo, a repetição não é um simples tautológico, pois ela expressa algo novo”. E ele complementa afirmando que repetir os elementos linguísticos não é o mesmo que repetir conteúdo, assim como Oliveira (1998) diz que repetir não é dizer o mesmo. Outra autora selecionada para você conhecer o conceito de repetição é Kerbrat-Orecchioni (2006), a qual diz que a repetição revela um domínio de construção de enunciados, oriundo de natureza diversa daquela que se observa na escrita, pois as condições de produção e recepção do texto são diferentes.

Com essas definições, você deve ter percebido que a repetição na oralidade não é fruto de mau uso da língua, mas, sim, trata-se de um recurso que sustenta a nossa fala, assim como as pausas e os truncamentos.

PAUSAS E TRUNCAMENTOS

As pausas marcam uma “parada” na fala, que pode ou não ser preenchida pelo interlocutor ou pelo próprio locutor. Galembeck e Carvalho (1997) acrescentam que o silêncio deixado pela pausa não preenchida pode resultar em problema, pois o locutor se torna vulnerável, abrindo espaço para que o turno seja preenchido pelo interlocutor; daí a necessidade de se preencher as pausas com marcadores, como ahn, uhn, eh e ah, e com alongamentos, como certo::, ahn::.

Já o truncamento é a redução de uma palavra sem a perda de seu sentido: professora para “prô” ou “prófi”. Para melhor explicarmos, trazemos Araújo (2002), ao dizer que a redução na palavra pelo fenômeno de truncamento não traz prejuízo ao valor semântico da palavra, como “refri” para refrigerante ou “ceva” para cerveja. O autor acrescenta que, para que o truncamento aconteça, é preciso que a palavra matriz seja, no mínimo, trissílaba, ou seja, tenha, no mínimo, três sílabas: bijuteria – “biju”.

A forma truncada e a palavra-matriz devem ser semântica e pragmaticamente intercambiáveis, ou seja, uma forma pode ser substituída pela outra sem que haja perda de sentido. Além disso, a palavra truncada geralmente possui duas sílabas, como em cerva, embora haja casos de truncamentos com três sílabas (respónsa). (ARAÚJO, 2002, p. 65)

Autor da citação
DIFERENÇAS DIALETAIS

Araújo (2002) traz uma reflexão bastante importante quando diz que as diferenças dialetais (as variedades) têm um papel importante na formação dos truncamentos. Eis aqui alguns exemplos que Araújo (2002) apresenta em seu texto: “refrí” (paulista) e “réfri” (paraense), em refrigerante; “prófi” (paulista), para professor, “profí” (gaúcho), para profissional. Esses exemplos nos permitem verificar que os truncamentos, ou abreviações, ou encurtamentos, não são meras reduções de palavras, mas a variedade na qual o dizer é produzido ou, ainda, o contexto em que a palavra é determinada é fundamental na formação do truncamento.

MARCADORES CONVERSACIONAIS

Na oralidade, encontramos também os marcadores conversacionais, elementos que constituem as produções orais e organizam o texto. Santos (2006) diz que os marcadores conversacionais estabelecem relações entre as unidades de um texto e os interlocutores. Urbano (1999) também apresenta os marcadores conversacionais nessa mesma linha. Para ele, os marcadores conversacionais acontecem na fala com bastante frequência e contribuem para a coesão e a coerência do texto oral.

Por que você acha que utilizamos marcadores conversacionais em nossas falas? Santos (2006, p. 28) responde que os marcadores conversacionais “são utilizados pelos interlocutores para dar tempo à organização do pensamento, sustentar o turno, monitorar o ouvinte quanto à recepção, interromper ou finalizar o turno conversacional etc.”, e isso resulta em marcas do envolvimento dos interlocutores na interação. Mais uma vez, você pode perceber que a utilização dos marcadores conversacionais vai além de serem apenas marcas de oralidade.

Assimile 
  • Você se lembra das discussões sobre adequação linguística? Repare que recorremos a Teixeira (2012) para retomar esta questão, pois, se consideramos a linguagem enquanto interação e que nossa língua possui muitas variedades, tudo o que sustenta a oralidade precisa ser pautado em adequação, e não em certo ou errado.
  • Para Dubois et al. (1973), “o estilo constitui a marca da individualidade do sujeito no discurso”.
  • Basicamente, temos três modos de entonação quando pronunciamos uma frase:
    • Ascendente: quando o tom da voz vai aumentando e finaliza mais alto que o tom utilizado no início; resulta em algo mais alegre.
    • Descendente: quando o tom da voz vai diminuindo e finaliza mais baixo que o tom utilizado no início; produz um efeito de tristeza.
    • Linear: quando o tom que inicia é o mesmo que finaliza; geralmente, utilizado quando o lado emocional fica em segundo plano, sendo mais objetivo.

E quais seriam os marcadores conversacionais? A seguir, você verá um quadro elaborado a partir das pesquisas de Galembeck e Carvalho (1997, p. 4-19), que serve de base para muitos estudos de oralidade.

Quadro 2.2 | Marcadores conversacionais
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Posicionados no início do turno não; mas; acho que; não é assim.

Esses marcadores caracterizam o início ou a tomada de turno.
Interacional ou interpessoal:
construção e gestão do ato conversacional.

Tomada de turno éh; oh; ah; bom; pois é.
Envolvimento do ouvinte olha; veja; você vê; você acha; então você quer dizer o quê?
Marcadores de opinião eu acho (que); creio (que); eu gostaria de saber; eu sei; me parece que; eu tenho a impressão; acredito que.
Ideacional: 
elementos de coesão entre as partes.

e; mas; então; além disso; agora; aliás.
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Posicionados no meio do turno né? sabe? entende? digamos; advérbios; conjunções; alongamentos que são responsáveis pelo desenvolvimento do turno.
Interacional
Envolvimento do ouvinte
veja; veja você; olha; você sabe; você repara; você imagina; você pode ver.
Sustentação do turno
marcadores não lexicalizados: ahn; uhn; eh; ah; marcadores de alongamentos: certo::; ahn::
Manifestação de opiniões
creio que; acredito que; tenho certeza que.
Ideacional ou coesiva
Algumas conjunções e advérbios: e; mas; agora; porque; então; depois; além disso.
Posicionados no final do turno
né? não é? entendeu? perguntas diretas e pausa conclusa que assinalam a passagem implícita ou explícita do turno. Interacional Passagem requerida
né? não é? certo? entende?
Passagem consentida 
É assinalada, na maioria das vezes, pelo final de uma frase declarativa (entonação descendente).
Fonte: adaptado de Galembeck e Carvalho (1997, p. 4-19).

Todos esses elementos que constituem a oralidade têm a mesma importância que o último elemento que estudaremos: entonação enfática. A entonação enfática diz respeito ao “tom” que damos aos nossos textos orais, ao modo como pronunciamos determinadas palavras. Você já percebeu que, dependendo da entonação que colocamos em algumas palavras ou frases, interpretamos que o interlocutor está irritado, ordenando algo ou sendo irônico, por exemplo?

Esses elementos característicos da língua oral – as entonações, a altura de voz, o tom etc. –, para Travaglia et al. (2013), aparecem em todos os gêneros orais. Há gêneros orais, discursos políticos ou discursos orais em canais de youtubers, por exemplo, em que a entonação e a altura de voz são recorrentes, constituindo, assim, características desses gêneros. O tom também marca características de determinados gêneros orais: solene, em uma cerimônia de formatura; tristeza, em anúncios de falecimento transmitidos em carros de som; alegria, em comandos dados por animadores de festas infantis; deboche, em apresentações de standup

Saiba mais

Ainda sobre as entonações enfáticas, Ribeiro et al. ([s.d.]), pelo Programa de Formação Continuada em Mídias na Educação, da Secretaria de Educação a Distância do MEC, produziram um módulo sobre rádio. É bastante válido você visitar o site desse programa, pois há indicações e sugestões bastante pertinentes para o trabalho com diferentes mídias na escola. Para esta seção, priorizamos o rádio, pois, nas diretrizes para a construção dele, o módulo apresenta explicações relevantes que nos permitem associar ao conteúdo “entonações enfáticas”, que estamos discutindo agora.

Para os autores, a ênfase “é a energia da fala, a vitalidade da palavra falada” ([s.p.]), e em uma frase existem uma ou mais palavras que pedem maior ênfase ao serem enunciadas. Podemos acrescentar que a ênfase que damos a uma palavra, e não em outra, em uma frase revela sentidos que estão funcionando naquele dizer. Já a entonação “é a música da linguagem” ([s.p.]), assim, cada palavra tem a sua variedade melódica, de acordo com o sentido.

Você se lembra da epígrafe de Certeau e Giard (2013) que abriu esta seção, quando falamos da “tagarelice” das crianças como um arranjo musical? Falamos isso a partir dessa definição poética que Ribeiro et al. ([s.d.]) fazem da entonação, e bem sabemos o quanto as crianças, na escola e fora dela, fazem uso da entonação para expor suas ideias, defender seu ponto de vista e reivindicar sentidos.

Reflita

Releia a epígrafe que introduz a seção e reflita: quem tem direito à fala? Quem pode produzir oralidade em nossa sociedade?

Em relação aos truncamentos, você acha que eles são meras reduções de palavras ou há algo que determine ou autorize a redução em determinados contextos?

Confira o exemplo de entonação enfática descrito por Ribeiro et al. ([s.d.], [s.p.]):

Você viu aquele sujeito sair daqui?

Você viu aquele sujeito sair daqui?

Você viu aquele sujeito sair daqui?

Você viu aquele sujeito sair daqui?

Você viu aquele sujeito sair daqui?

Você viu aquele sujeito sair daqui?

Perceba que, se você pronunciar essas frases dando ênfase às palavras destacadas, a relevância do sentido muda bastante. Esse exemplo permite refletir sobre a entonação enfática enquanto elemento constituinte da oralidade e que afeta na produção dos sentidos daquilo que falamos. 

Exemplificando

Como exemplo de repetição, você pode observar na própria fala das crianças na escola ou em reuniões escolares as repetições que fazemos por meio de encadeamento:

F1: Só faltam dois preenchimentos para eu finalizar o relatório da disciplina.

F2: Relatório de disciplina?

F1: Sim, relatório de disciplina, deste bimestre, com entrega para a coordenação.

F2: Ah, sim, esse relatório de disciplina eu já entreguei.

Uma ocorrência de pausas muito comum acontece durante as aulas, quando um professor inicia uma palavra ou frase e, pela pausa, espera que os alunos “preencham” essa lacuna deixada de forma proposital. Perceba que essa pausa possui o caráter de analisar se os alunos sabem o conteúdo ou se estão atentos à explicação. 

É a partir de exemplos e pensando em situações contextualizadas que esses elementos constituintes da oralidade podem ser ensinados – tanto a entonação quanto a repetição, as pausas, os truncamentos e os marcadores conversacionais – e, de forma reflexiva, colocando a criança frente a situações em que os usos na oralidade não são mero fruto do desejo de quem fala, mas determinados por fatores (elementos) próprios da língua.

Foco na BNCC 

O eixo Oralidade, na BNCC (2017), prevê práticas de linguagem de uso oral que envolvem tanto a compreensão da escuta quanto a produção da fala, negociando os significados entre os interlocutores, com ou sem contato face a face. Ensinar oralidade é ensinar que cada gênero possui características específicas e, atrelado a isso, há as particularidades da fala dos interlocutores, que são uma das marcas de sua identidade. Dentre isso, temos as escolhas lexicais e frasais, a pronúncia, a entonação e o ritmo. Perceba que estudar a entonação e os marcadores conversacionais enquanto lugares de identidade do falante contribui para que você utilize as diferentes linguagens para se expressar e para que seu aluno amplie os modos de expressão.

Nesta seção, você conheceu um pouco mais sobre as repetições, as pausas e os truncamentos, entendendo que esses são elementos constituintes da oralidade bastante importantes e que mostram certo domínio de língua nas produções orais. Os marcadores conversacionais foram mostrados com o intuito de evidenciar o quanto afetam na organização textual e na relação entre os interlocutores, assim como a entonação que damos a algumas palavras ou frases em um texto oral.

Faça valer a pena

Questão 1

Os embrulhos – Maria Clara Machado
[...]
Velho - E aí?
Velha - Aí eu apareci e perguntei a ela por que estava dando nosso pão-de-ló para ele, e ela disse...disse assim mesmo: “É meu amigo, dona Nenguinha, dei um pedacinho de pão-de-ló a ele...
Velho - E o que é que você disse?
Velha - Não disse nada, eu não sabia o que dizer. O que é que eu tinha que dizer, hein, Neguinho?
Velho - Você tinha que dizer que o pão-de-ló não era dela para estar distribuindo assim a torto e a direito para os que aparecem.
(O Velho sai) 
[...]

(MACHADO, 1970, [s.p.])

Tomando como referência o diálogo entre o velho e a velha na peça infantil de Maria Clara Machado, classifique as afirmativas a seguir em verdadeiras (V) ou falsas (F):

(  ) As repetições, mesmo na oralidade, marcam uma falta de planejamento textual.

(  ) As pausas aparecem quando o falante não sabe ao certo o que dizer.

(  ) O modo das trocas de turnos no diálogo mostra que os falantes possuem certa intimidade.

(  ) Os marcadores conversacionais foram utilizados de forma inadequada no diálogo.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência correta:

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Correto!

Analisando as alternativas falsas, podemos dizer que as repetições são constitutivas da oralidade e não resultam de um mal planejamento, muito pelo contrário, às vezes, reforçam um sentido que o falante quer produzir ou produz um encadeamento na fala do interlocutor. Por exemplo: Aí / aí: marca o encadeamento na fala anterior do interlocutor; Disse (pausa)/ disse: é uma retomada para dar continuidade à fala; E o que você disse? / não disse nada: encadeamento na fala anterior do interlocutor.

 Esses exemplos reforçam o que discutimos ao longo desta seção, ou seja, a repetição é um elemento que afeta o sentido do texto.

As pausas são outro elemento próprio da oralidade e são uma “lacuna” que se sustenta pelo dizer que se segue, como na fala da velha: “ela disse...disse assim mesmo”. A pausa, nesse caso, é preenchida pelo dizer que se segue. Outro exemplo, ainda na fala da velha, é quando retoma a fala de um terceiro sobre ter dado o pão a outro: “dona Nenguinha, dei um pedacinho de pão-de-ló a ele...”, como se a velha estivesse passando o turno para o velho, abrindo espaço para ele falar.

Nenhum marcador conversacional, neste diálogo, foi usado de forma inadequada. Exemplificando “E aí? / Aí eu apareci”: o “e aí?” marca a troca do turno (consideremos que a conversa já estava acontecendo e foi recortada apenas para fins estruturais de questão objetiva). Outro exemplo: “O que é que eu tinha que dizer, hein, Neguinho?”. O “hein” funciona como um questionamento para o velho, quase uma provocação, esperando que ele responda algo para ela, que, no contexto, não ia resolver. Os marcadores conversacionais neste diálogo contribuíram para o andamento da conversa, sustentando os dizeres dos interlocutores.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Questão 2

Os marcadores de introdução de tópico não funcionam apenas para indicar que se está passando para algo novo, mas que esta passagem tem alguma razão de ser e deve ser notada (caso contrário, pode surgir a clássica pergunta: ‘por que isso agora?’). Entre esses marcadores, temos alguns típicos, como: ‘isto me lembra aquela do’ (e se conta o caso), ou ‘sim, mas mudando de assunto’, ou então ‘mas voltando ao assunto’. 

(MARCUSCHI, 2007, p. 77-78)

Considerando o contexto dos marcadores conversacionais, avalie as afirmativas a seguir:

  1. Os marcadores conversacionais servem também para preencher lacunas deixadas na oralidade.
  2. Os marcadores conversacionais estabelecem relações coesivas no texto e contribuem para a coerência.
  3. Os marcadores conversacionais são marcas informais que usamos na oralidade e que comprometem o entendimento do texto.

Considerando o contexto apresentado, assinale a alternativa correta:

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Correto!

Os marcadores conversacionais são marcas que utilizamos na oralidade e que auxiliam no entendimento do texto, que dão encadeamento à nossa fala e aos diálogos.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Esta alternativa está incorreta. Leia novamente a questão e reflita sobre o conteúdo para tentar novamente.

Questão 3

Marcuschi (2008, p. 25) diz que a fala “caracteriza-se pelo uso da língua na sua forma de sons sistematicamente articulados e significativos”. A isso ele acrescenta os aspectos prosódicos, que envolvem a entonação e o ritmo da fala, e outros recursos que usamos para nos expressar: os gestos, os movimentos do corpo e a mímica.

Na relação entre a fala e o ensino dos elementos constitutivos da oralidade, podemos afirmar que:

A escola não ensina a fala, esta se aprende nas atividades cotidianas, assim como andar. Essas são características comuns aos seres, raro quando possuem alguma limitação.
Os marcadores conversacionais não são um recurso de falantes com pouco conhecimento linguístico. Todos os falantes, em situações de produção de textos orais, se utilizam de marcadores conversacionais para produzir seu texto. 

Correto!

Parabéns! Você demonstrou que compreendeu que o sistema linguístico na oralidade é o mesmo da escrita.

Vimos, nesta seção, a importância da entonação na produção dos sentidos, ou seja, os sons da língua, pela entonação que colocamos nas palavras e frases, determinam os sentidos.

Os marcadores conversacionais auxiliam na coesão e coerência textuais.

referências

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CAGLIARI, L. C. Elementos de fonética do Português brasileiro. São Paulo: Paulistana, 2007.

CERTEAU, M. de; GIARD, L. Uma ciência prática do singular. In: CERTEAU, M. de; GIARD, L.; MAYOL, P. A invenção do cotidiano: 2. Morar, cozinhar. 12. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013. p. 335-342. 

DUBOIS, J. et al. Dicionário de Linguística. São Paulo: Cultrix, 1973.

GALEMBECK, P. de T.; CARVALHO, K. A. Os marcadores conversacionais na fala culta de São Paulo. Projeto NURC/SP. Intercâmbio, São Paulo, v. 6, p. 1-22, 1997.

KERBRAT-ORECCHIONI, C. Análise da Conversação: princípios e métodos. São Paulo: Parábola, 2006.

KOCH, I. G. V. Referenciação e orientação argumentativa. In: KOCH, I. G. V.; MORATO, E. M.; BENTES, A. C. Referenciação e discurso. São Paulo: Contexto, 2005. p. 33-52.

MACHADO, M. C. Os embrulhos. 1970. Disponível em: https://bit.ly/3pUXPy9. Acesso em: 2 jun. 2020.

MARCUSCHI, L. A. Repetição. In: JUBRAN, C. C. A. S.; KOCH, I. G. V. (Orgs). Gramática do português culto falado no Brasil: construção do texto falado. Campinas, SP: Ed. da Unicamp, 2006. p. 219-254.

MARCUSCHI, L. A. Análise da conversação. 6. ed. São Paulo: Ática, 2007.

MARCUSCHI L. A. Da fala para a escrita: atividades de retextualização. 9. ed. São Paulo: Cortez, 2008.

MARCUSCHI, L.; DIONISIO, A. P. Fala e escrita. Belo Horizonte, MG: Autêntica, 2007.

OLIVEIRA, M. R. de. Repetição em diálogos: análise funcional da conversação. Niterói, RJ: EDUFF, 1998.

RIBEIRO, B. C. et al. Oficina de Rádio – Recursos de Áudio na WEB. Mídias na educação. São Paulo: SEED/MEC, [s.d.]. Disponível em: https://bit.ly/2Lo1zcD. Acesso em: 3 jun. 2020.

SANTOS, G. B. O papel da instrução na produção oral de aprendizes de língua inglesa: um estudo sobre marcadores conversacionais. 2006, 155 f. Dissertação (Mestrado em Linguística) – Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2006.

SILVA, D. E. G. da. A repetição em narrativas de adolescentes: do oral ao escrito. Brasília, DF: Plano Editora/Instituto de Letras-UnB, 2001.

TEIXEIRA, L. Gêneros orais na escola. Bakhtiniana, v. 7, n. 1, p. 240-252, 2012. Disponível em: https://bit.ly/3hLKJQO. Acesso em: 2 jun. 2020.

TRAVAGLIA, L. C. et al. Gêneros orais – Conceituação e caracterização. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE LETRAS E LINGUÍSTICA, 4., Uberlândia, 2013. Anais [...]. Uberlândia, MG: SILEL, 2013. Disponível em https://bit.ly/3bcJF7g. Acesso em: 2 jun. 2020.

URBANO, H. Marcadores conversacionais. In: PRETI, D. (Org.). Análise de textos orais. 4. ed. São Paulo: Humanitas Publicações FFLCH/USP, 1999. p. 81-102.

Bons estudos!

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